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    Samuel Pessôa

    Luzes no fim do túnel

    05/07/2015 02h00

    Há duas semanas o IBGE divulgou a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) referente a maio. A PME apura diversas estatísticas do mercado de trabalho nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Recife. O resultado da pesquisa sugere que o ajuste do mercado de trabalho tem avançado mais rapidamente do que o previsto há alguns meses.

    A "boa notícia" foi a queda de 5% do rendimento médio real. Mais importante ainda, essa queda foi fruto de aumento nominal do rendimento de 3,5% ante maio de 2014 e da elevação da inflação de 8,5%. A "boa notícia", portanto, foi que os salários nominais têm crescido a taxas cada vez menores. Após aumentarem 7,5% em fevereiro, o ritmo caiu para 5,3%, 5,4% e 3,4%, respectivamente, em março, abril e maio, sempre tomando como base de comparação o mesmo mês do ano anterior.

    Aqui aparece o lado negro da economia. Queda de salário real é boa notícia! O motivo é que a combinação entre queda de salário real e elevação da taxa de desemprego sugere que o mercado de trabalho está sendo mais flexível do que se imaginava há alguns meses.

    Até o momento, a queda de 5% do salário real ocorreu com elevação da taxa de desemprego (ante maio de 2014) de 1,8 ponto percentual, de 4,9% para 6,7%.

    Quanto mais rápida for a queda do salário real, mais rapidamente a inflação –principalmente a inflação de serviços– convergirá para a meta e, portanto, mais rapidamente o Banco Central poderá iniciar um ciclo de redução da taxa de juros e, menor portanto, será o aumento do desemprego.

    Analogamente, quanto mais rapidamente os salários reais se ajustarem à realidade da produtividade do trabalho no Brasil, mais rapidamente caminharemos no ajuste externo. Provavelmente já reduziremos o deficit de transações correntes dos US$ 105 bilhões de 2014 para US$ 85 bilhões em 2015.

    Ou seja, tudo caminha para que, em um ano e meio, no início de 2017, divisemos inflação na meta e deficit externo de 2,5% do PIB. Se a economia conseguir retomar crescimento na casa de 2% a 2,5% ao ano, teremos obtido, após dois longos anos de ajustes, equilíbrio macroeconômico, mesmo que precário, a partir do qual poderemos pensar em voos mais altos.

    O grande problema, e essa é a má notícia, é que, mesmo que tudo ocorra conforme esse roteiro, estaremos ainda vivenciando forte desequilíbrio nas contas públicas. Isto é, não conseguiremos nos próximos anos construir um superavit primário que estabilize a dinâmica da dívida pública, que faça com que a relação dívida-PIB pare de crescer.

    Parece-me que a estratégia do ministro Levy hoje é tentar arrumar o que é possível da casa o mais rapidamente, para que fique claro à sociedade o desequilíbrio da política fiscal.

    A política fiscal está ajudando o combate à inflação. Temos hoje política fiscal contracionista. O problema é de nível. O desequilíbrio fiscal cresceu tanto que, sem forte elevação da carga tributária, sem uma forte desvinculação da receita da União e sem rever profundamente os critérios de elegibilidade e valor dos benefícios de nosso Estado de bem-estar social, não será possível chegarmos a um nível de superavit primário que estabilize a dívida pública.

    O ministro conseguirá ou não? Minha intuição é que, apesar das boas notícias com relação ao ajuste no mercado de trabalho, na inflação e possivelmente no setor externo, não conseguiremos alcançar as condições de uma política fiscal sustentável.

    samuel pessôa

    É físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV. Escreve aos domingos.

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