• Colunistas

    Tuesday, 07-May-2024 14:25:23 -03
    Sérgio Dávila

    A importância do jornalismo profissional num mundo 'pós-verdade'

    15/10/2016 02h00

    Reprodução
    Cartaz de divulgação da peça "The Front Page"
    Cartaz de divulgação da peça "The Front Page", que estreou na Broadway, em Nova York (EUA)

    Numa das cenas principais de "The Front Page" (A Primeira Página), o repórter veterano Hildy Johnson dá sua definição de jornalista: um bando de intrometidos que incomoda os outros enquanto corre atrás da notícia para que as pessoas saibam o que está acontecendo.

    Ele usa palavras menos edificantes que as acima, como pode ser conferido na montagem mais recente da comédia de 1928, que estreou há três semanas na Broadway, em Nova York, com John Slattery como Hildy e Nathan Lane como seu editor.

    Ambos trabalham para o fictício jornal "Chicago Examiner" e desvendam um escândalo que envolve o prefeito da cidade, seu xerife e um condenado à morte. A peça é hilariante e tem ingressos esgotados pelos próximos meses.

    Muitos consideram "The Front Page" a pedra de Rosetta do jornalismo, referindo-se à descoberta arqueológica que permitiu que os hieróglifos egípcios fossem decifrados. Todos os vícios e virtudes da profissão estariam representados naquela comédia.

    De fato, 88 anos depois, sua atualidade é assustadora.

    Na corrida presidencial norte-americana, foram intrometidos incômodos como os definidos por Hildy —chamemos de jornalistas profissionais, de títulos como "The New York Times" e "Washington Post"— que descobriram os principais desmandos da candidata democrata, Hillary Clinton, e de seu oponente, o republicano Donald Trump.

    Numa era definida pela revista "The Economist" como da "pós-verdade", em que políticos do mundo inteiro dizem o que querem sem se preocupar com a realidade e em que a censura não se dá mais da maneira tradicional, com supressão de conteúdo, mas pela meticulosa publicação de mentiras nas redes sociais, cabe aos jornalistas profissionais ajudar a separar fato de boato.

    Nesse sentido, viraram ferramentas cívicas as equipes de checagem de fatos, que atuam principalmente durante as eleições, como fazem os já citados "Times" e "Post" e como vem fazendo esta Folha, entre outros jornais brasileiros.

    Investigar com rigor, usando técnicas consagradas e seguindo preceitos éticos —uma das definições do jornalismo profissional—não só é vital para a democracia como economiza dinheiro. É isso o que conclui o economista Jay Hamilton, de Stanford, em seu livro recém-lançado "Democracy's Detectives" (Detetives da Democracia, Harvard Press).

    Com base em 150 casos do premiado repórter Pat Stith, do "News and Observer", de Raleigh, na Carolina do Norte, ele conclui que cada dólar gasto com jornalismo investigativo pode gerar centenas de dólares em benefícios sociais, seja por mudança de leis, seja por interromper casos contínuos de corrupção, seja por ajudar a evolução da vida em sociedade.

    sérgio dávila

    É editor-executivo da Folha. Foi correspondente nos EUA, onde cobriu o 11 de Setembro e a eleição de Barack Obama. Foi o único repórter brasileiro no início da Guerra do Iraque.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024