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    Sérgio Malbergier

    O Brasil contra os ricos

    04/10/2012 07h07

    A política externa brasileira, política e econômica, não perde uma oportunidade de bater nos países que chama cinicamente de ricos, uma vez que somos já um dos países mais ricos do mundo.

    Os ataques da presidente Dilma e do ministro Mantega acontecem com cada vez mais frequência, intensidade e abrangência .

    Claro, em tempos de crescimento raquítico, nada melhor que inventar culpados externos pelo mau desempenho. Isso é mais velho que o protecionismo brasileiro. Mas o que dá ênfase ao movimento é o genuíno sentimento antirricos enraizado na atual liderança nacional.

    Não há dúvida de que o Brasil cresceu e crescerá no mundo ao se colocar como não alinhado ao eixo EUA-Europa-Japão. Mas é possível (e desejável) ser não alinhado sem ser hostil.

    Pois hostil temos sido, isso é inegável. Dilma em menos de duas semanas atacou os ricos do maior fórum global, a Assembleia Geral da ONU, depois durante visita do premiê britânico, David Cameron, e depois na Cúpula da Aspa (associação entre América do Sul e países árabes), iniciativa brasileira que não foi bem uma cúpula porque a liderança árabe não compareceu.
    Mantega também seguiu disparando depois que EUA, Europa, Japão e Austrália criticaram duramente a elevação das tarifas de importação brasileiras. Mas Mantega está sempre disparando. Num discurso que transita do cínico ao incoerente.

    O Brasil é um país muito mais fechado que os EUA, mas acusa os EUA de protecionistas. Os gestores da política econômica brasileira defendem e aplicam uma política monetária mais expansionista por causa da crise, mas atacam EUA e Europa, epicentros da crise, por praticarem também política monetária expansionista.

    No campo político, nesta era petista, o Brasil retomou o viés terceiro-mundista que seduziu também a ditadura militar durante certo período. Queremos ser líderes globais, mas mais especificamente do segundo e terceiro escalões dos países em termos de desenvolvimento.

    Fizemos a tal opção pelos pobres, que tem seu inegável valor político e econômico. O problema é ter feito a opção pelos pobres em detrimento da relação com os ricos. Nosso ataque incessante se dá justamente quando eles enfrentam sua pior crise em décadas.

    Há de fato espaço para sermos um líder entre países do segundo e terceiro escalão. Mas o espaço brasileiro será muito maior se nos engajarmos mais também com nossos históricos parceiros do Hemisfério Norte, com quem temos muito mais afinidade.

    O Brasil capitalista e democrático devia estar ao menos tão entrosado com os países capitalistas e democráticos quanto com ditaduras e economias fechadas. Nossa capacidade, por exemplo, de fechar acordos de liberalização comercial com Europa e EUA hoje são nulas dadas as nossas alianças regionais com Argentina e Venezuela, por exemplo. Enquanto isso, conseguimos fechar um acordo comercial Mercosul-Países Árabes, que tem relevância e valor. Mas por que não buscar também genuinamente acordos com nossos históricos parceiros comerciais na Europa e EUA, com mais potencial?

    A boa vontade de europeus, americanos e japoneses com o Brasil já foi maior, mas segue muito grande. Foram os investidores e consumidores desses países que em boa parte sustentaram a emergência brasileira. Eles estão muito mais ressabiados agora, depois de tanto desaforo (à enorme lista de componentes do custo Brasil, agora temos este: o custo desaforo).

    Pacífico, democrático, capitalista, multilateralista, o Brasil tem todos os atributos para emergir como uma das grandes potências globais do século 21. Essa benignidade brasileira pode nos tornar a melhor ponte entre Norte e Sul. Mas insistimos em olhar só para o lado e para baixo, ao invés de olharmos para cima.

    sérgio malbergier

    Escreveu até abril de 2016

    É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".

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