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    Sérgio Malbergier

    Omissão e demissão

    29/08/2013 03h00

    O novo chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, tem pé quente. Estreou no meio de uma grande crise internacional: o iminente ataque punitivo dos EUA e aliados contra o governo sírio pelo uso de armas químicas. E, no melhor estilo do Itamaraty nos últimos anos, decepcionou.

    "Para nós, o uso da força nas relações internacionais é o último recurso, e ele tem que ser feito apenas em casos de defesa (...) ou autorizado especificamente nos termos de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU", disse o novo chanceler ontem após tomar posse.

    Todo mundo sabe que a ONU não autorizará uma intervenção na Síria dado o veto da Rússia, maior aliada do regime Assad depois do Irã, no Conselho. Então o que Figueiredo está dizendo é que o Brasil, com enorme colônia síria e árabe, não se importa com sírios mortos por armas químicas nos subúrbios de Damasco.

    Nada contra Figueiredo. Como ele próprio lembrou, essa tem sido a posição do Brasil, novamente aplicada. Mesmo com o agravante gravíssimo, neste caso, de uso de armas de destruição em massa contra civis indefesos, um crime contra a humanidade, que, impune, tende a se multiplicar, e sobre o qual o Brasil se omitiu.

    Como sempre, são os EUA a liderar a reação mundial, goste-se ou não. Num discurso forte, ao contrário da burocrática conversa brasileira, o chanceler americano, John Kerry, disparou: "O que vimos na Síria dever chocar a consciência do mundo. É contra qualquer código moral. Deixe-me ser claro. A matança indiscriminada de civis, o assassinato de mulheres, crianças e transeuntes inocentes com armas químicas é uma obscenidade moral. Medida por qualquer padrão, é imperdoável. E, apesar das desculpas e subterfúgios fabricados por alguns, é inegável".

    Muito mais coerente e efetivo do que a postura cínica do Brasil de condicionar qualquer ação a uma aprovação da ONU que não há risco de acontecer.

    Como não há risco de um gesto mais ousado da política externa brasileira sob o comando de Dilma, limitada de um lado pelo Itamaraty pós-Celso Amorim/Samuel Pinheiro Guimarães e do outro por Marco Aurélio Garcia, o assessor presidencial para a área. Desinteressada, a presidente pouco fez além de nomear um discreto chanceler. Na era da globalização, conduz a política externa na banguela.

    Deu no que deu. O Brasil encolheu, a reboque de alianças estreitas e cada vez mais à esquerda. O abraço nos bolivarianos e a ênfase no Sul se deram por exclusão do Norte, quando o Brasil tem vocação única para ser a melhor ponte entre Norte e Sul: grande potência Ocidental do Sul, democrático, capitalista, pobre entre os ricos, rico entre os pobres.

    Mas insistimos em ser menos. Como o chanceler demitido Antonio Patriota, que caiu muito mais pelo que não fez do que pelo que fez.

    A épica fuga do senador boliviano da embaixada brasileira em La Paz pelas mãos de um diplomata rebelde, digna de romances de John Le Carré e Gabriel Garcia Marquez, acabou se transformando no grande momento da chancelaria dilmista até aqui.

    Mas, como tem acontecido, com quase nenhuma consequência além da entrega da cabeça do chanceler Antonio Patriota à Bolívia.

    sérgio malbergier

    Escreveu até abril de 2016

    É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".

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