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    Sérgio Malbergier

    O anão acordou

    17/10/2013 03h00

    Perdi o melhor da festa. Não frequentava passeata desde o despertar de junho. Ontem, me bati sem querer querendo com alguns poucos manifestantes no mesmo Largo da Batata da primeira grande manifestação paulistana deste ano.

    O que era então uma massa ao mesmo tempo diversa e coesa hoje é só uma pasta coesa de jovens com liberdade para descarregar aquela velha energia juvenil, transformando ruas em videogames políticos diante de policias ineptas.

    Além dos grupos de pressão de sempre, sobraram nas ruas apenas jovens punks ou esquerdistas, o mesmo mix rebelde de décadas anteriores, os segundos como sempre instrumentos de partidos políticos, hoje mais organizados pela revolução on-line e empoderados pelas grandes manifestações de junho.

    Como sempre no Brasil vemos o surgimento de uma força legítima logo desviada por ineficiências, espertalhões e grupos de pressão organizados, sempre prontos a ocupar o vácuo da baixa politização geral com suas agendas estreitas.

    Junho foi um brevíssimo movimento de massa contra a corrupção pandêmica e por um Estado mais eficiente que engajou as classes médias e os odiados ricos e justamente por isso abalou tanto o sistema político e os governantes.

    Tanto que hoje, com o cinismo de sempre, todos os políticos e partidos endossam os protestos de junho, que eram justamente contra todos eles. Em São Paulo, cúmulo dos cúmulos, as passeatas contra também a alta carga tributária gerou aumento violento de imposto.

    Por mais que você a odeie, só a elite salva.

    Diante da baixa educação do povo brasileiro, e isso não é um insulto, mas uma denúncia, só a elite mais educada pode liderar uma revolta contra o revoltante. Foi assim nas Diretas Já e no movimento que derrubou o presidente Collor.

    Essa tração das camadas superiores é mortal numa revolução, pois sua capacidade de liderar e realizar é maior. Grande parte da liderança bolchevique era classe média.

    Mas a elite brasileira voltou a dormir, fechou-se em desconfortável conforto, em insegura segurança.

    De volta à avenida Faria Lima, estudantes, o bloco preto e inúmeros policiais viraram na Eusébio Matoso rumo à USP, quando tive de voltar à minha vida. Acabei perdendo o quebra-quebra: lojas, bancos, carros e uma estação de metrô vandalizados, de novo, apesar da previsibilidade e da presença ostensiva da polícia.

    No fundo, essa onda de quebra-paus diz mais da inépcia policial do que da capacidade de ação desses pequenos grupos juvenis. Uma conjuntura sectário-niilista que só afasta as massas de fato transformadoras das ruas.

    O despertar do gigante despertou na verdade anões.

    sérgio malbergier

    Escreveu até abril de 2016

    É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".

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