Quem tem mais de 30 anos lembra os anos loucos da economia brasileira, da hiperinflação, dos calotes, da certeza de que éramos incapazes de sair daquele buraco no qual a ditadura havia lentamente nos enterrado.
Era moda dizer que era impossível saber o preço da Coca-cola e que banco seguro era banco suíço. Época em que desesperados com o caos econômico criaram a brigada de fiscais do Sarney, é isso mesmo, fiscais do Sarney, para caçar remarcadores de preço e produzir a cena maoista-tropicalista do gerente de supermercado entrando no camburão na tela do Jornal Nacional. Era época em que se confiscava a poupança do país numa canetada, de surpresa, sob o aplauso de alguns e protestos de menos ainda.
Naquele caos pós-big bang democrático, o Plano Real veio como passe de mágica econômico e político. Econômico, ao matar a inflação reciclando plano israelense e abrir caminho para a estabilidade econômica. Político, ao transformar o PSDB no partido que é (ou foi), elegendo FHC em primeiro turno em 1994 –em 1989 Covas teve só 11% e ficou em quarto lugar na corrida presidencial.
FHC e Lula eram os melhores quadros de seus respectivos grupos, e o Brasil teve 16 anos seguidos de consistência e destino. Aí veio Dilma. A gerente-presidente assumiu o comando do país no melhor momento histórico, animado, crescendo, confiante. Com o primeiro mandato já quase segunda campanha, é possível começar a medir seu legado.
Qual é a grande marca de Dilma?
A um país cético, FHC mostrou que a estabilidade era possível e ainda deu um spray iluminista na consolidação democrática e institucional. Lula, primeiro presidente pobre do Brasil, pôs pela primeira vez os pobres no centro do Brasil com resultados presumivelmente extraordinários. Lula consolidou a economia de mercado e ainda pacificou nossa esquerda.
E Dilma?
A presidente apostou tudo numa visão de Estado forte, que seria mais capaz e legítimo que outros agentes para ditar os rumos da economia e do país. Baixou juros na marra, subsidiou a energia, tabelou retornos. Os resultados estão aí.
O país brecou. E agora anda devagar.
A sensação é de que voltamos a perder anos, empacamos. Comunidades pacificadas do Rio de Janeiro voltam a guerrear na véspera da Copa. A violência recrudesce. A corrupção devora o Estado. Os impostos aumentam. Os serviços públicos seguem ruins. O Judiciário é lento. A saúde e a educação públicas são precárias. Sem falar da infraestrutura, dos transportes, dos preços não subsidiados, das prisões infernais segundo admitiu o próprio ministro da Justiça.
Apesar desse registro, Dilma segue favorita nas eleições, suportada pela renda e emprego em níveis altos, assistencialismo social e o conservadorismo brasileiro.
O PT, o mais inteligente e articulado dos partidos, depois de capitalizar o sucesso do capitalismo brasileiro agora se beneficia do conservadorismo dos rincões, onde ninguém quer arriscar perder os ganhos e os benefícios dos últimos 12 anos.
Como seu plano econômico fracassou, pode ser este o legado de Dilma: A consolidação de um modelo populista moderado, com apoio eleitoral da base da pirâmide e centralismo econômico, capaz de ganhar eleições mesmo em conjuntura adversa pela qual pode ser responsabilizado.
É governar subestimando os eleitores, e isso sempre traz riscos.
É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".