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    Sérgio Malbergier

    Holofote da Copa ilumina fracassos

    24/04/2014 08h19

    Segunda-feira, Tiradentes, feriado, mais um, emendado com o da Sexta-Feira Santa, semana que vem tem o Primeiro de Maio, logo tem a Copa e depois as eleições! Não surpreende que 2015 seja ano de ajuste.

    Apesar de tanto feriado, ou talvez por isso, o clima no país não é de festa, mas de desânimo, O Brasil caminha para o passado, voltou a ser o país do futuro; Isso se as coisas melhorarem.

    Não era para ser assim. Quando ganhamos o direito de promover a Copa, em 2007, o sentimento era de euforia e orgulho. Dali a sete anos, mostraríamos ao mundo o novo Brasil, a nova potência. Mas o holofote da Copa até aqui ilumina fracassos, não conquistas. Expõe a nós e ao mundo, de forma crua e nua, incapacidades gerenciais, fraquezas sociais e deficiências estruturais do país.

    A 50 dias da Copa, as cidades-sede Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo são palco de conflitos violentos, com dezenas de mortos, dezenas de ônibus queimados e confusões nas esquinas. Símbolos do avanço da ordem morros cariocas acima, as UPPs se tornaram símbolos da brutalidade policial. A Petrobras, maior empresa nacional, é outro grande símbolo que mudou de sinal. O país mudou de sinal.

    Por isso o PT não quer que os eleitores comparem 2014 com 2010, o fracasso seria evidente. Ele quer comparar 2014 com a era pré-PT, como se houvesse um país antes e outro depois da chegada do partido ao poder. O que, de certa forma, é verdade. Em 12 anos, até Cuba mudou. Foi um período de grande avanço no mundo, especialmente no mundo emergente como o brasileiro. Lula foi um grande presidente pelo que fez e também pelo que não fez _ele não adotou a cartilha econômica da esquerda sul-americana, pelo contrário.

    Mas sua ungida sucessora mudou de rumo e com isso mudou o rumo. Ela pegou um país para cima e botou ele de lado ou para baixo em algumas áreas; Ressuscitou o complexo de vira-lata e o complexo de Miami. Bem na hora em que os gringos estão chegando.

    Os grandes veículos da imprensa internacional intensificam a cobertura do país-sede da Copa. Títulos globais como "New York Times", "Economist" e "Financial Times" despejam matérias que mostram ao mundo informado um país desleixado, ineficiente e inseguro. É o contrário do que se pretendia.

    A "Economist", sob o título "A soneca de 50 anos", desancou a produtividade brasileira. "Você começa a perder tempo assim que desembarca no Brasil", disse à revista empresário americano que se instalou aqui:.
    A impressão que dá é essa. Voltamos a perder tempo, anos. Uma impressão familiar para quem sobreviveu às décadas perdidas do século passado.

    Fugindo da pasmaceira do feriado, sintonizei na TV Bloomberg. Queria sentir a eletricidade dos mercados abertos. Enquanto a Bovespa dormia, a NYSE, a Bolsa de Nova York, estava a mil, no quinto dia seguido de alta até ali, a melhor sequência do ano.

    Aqui, nada, feriado duplo.

    Na esquina de casa, uma mulher-placa arrumava duas sacolas pesadas antes de tomar seu lugar entre os postes da luz e da placa de trânsito. Era uma mulher jovem, negra, vestindo moletom negro, segurando uma placa acrílica verde fosforescente anunciando um prédio ali perto.

    Uma cena terrível. E corriqueira. Fiquei imaginando onde a companheira se encaixa nas gloriosas estatísticas de renda e emprego do país.

    sérgio malbergier

    Escreveu até abril de 2016

    É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".

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