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    Sérgio Malbergier

    A grande moderação brasileira

    04/12/2014 02h00

    Entre tantas ironias que o fracasso proporciona, tem sabor especial o fato de o governo mais estatista e nacionalista desde Ernesto Geisel ser contido pelas agências de avaliação de risco de Wall Street.

    Essas agências avaliam para o mercado mundial a qualidade das dívidas dos governos e empresas brasileiras. Sua opinião importa. Elas vinham alertando que, se o governo federal seguisse gastando como se não houvesse amanhã, o país perderia o selo de bom pagador obtido em 2008 pela gestão Lula.

    Lula entendeu perfeitamente o valor financeiro e simbólico do "grau de investimento" concedido pelas agências. Ele barateou o crédito, atraiu investimentos e deu novo status financeiro ao país. O insustentável aumento da dívida pública ameaçava um de seus mais celebrados troféus.

    Na época em que o Brasil quebrava, vinha o FMI literalmente nos resgatar e, como contrapartida, endireitar os rumos da política fiscal do governo. A proclamação da independência do FMI em 2006 foi amplamente celebrada pelo petismo. Quebrar o país ficou muito mais difícil, graças às conquistas do período fiscalmente responsável da era petista. Mas se ficamos livres da tutela do FMI, quem dita os limites da gastança pública agora são as agências de Wall Street.

    Ainda bem. É o mercado sendo o mercado, a maior fonte de recursos da história da humanidade que o último governo não só não soube aproveitar como teimou em combater por razões que a razão desconhece.

    Os fatos, porém, se impuseram. Eles não poderiam ser mais eloquentes. O austero futuro ministro da Fazenda tem visão completamente diferente da que predominou nos últimos anos. O Banco Central também guinou à direita e acaba de dar mais uma paulada nos juros. Não sobrou pedra sobre pedra da nova matriz econômica. Ela durou muito menos que o já moribundo e muito mais nocivo socialismo do século 21 a assolar nossos vizinhos.

    A grande moderação brasileira tem seus ônus, mas também tem bônus. A esquerda chegou ao poder com Lula, mas ele sabiamente governou pela direita. Dilma resolveu radicalizar, à brasileira, esse radicalismo moderado, mas acabou contida pelas agências de Wall Street, pela resistência dos empresários e do enclave paulista e pela constatação incontestável do fracasso.

    Luciana Genro numa coisa tinha razão: Dilma e Aécio estavam fadados a implementar programas econômicos muito parecidos. O pré-ministro Joaquim Levy é muito mais próximo de Armínio Fraga do que de Guido Mantega (e Dilma Rousseff).

    Se Levy conseguir implementar o prometido, será o segundo arrocho fiscal conduzido pelo PT em 13 anos de poder. Dilma 1 desviou do caminho, Dilma 2 corrige a rota. Fica a pergunta: a esquerda derrotou a direita ou a direita cooptou a esquerda?

    sérgio malbergier

    Escreveu até abril de 2016

    É consultor de comunicação. Foi editor de "Dinheiro" e "Mundo".

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