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    Silvia Corrêa

    Minha cama, meu troféu

    24/08/2014 02h00

    Acordei com dor nas costas. Olhei em volta. Pompom, meu velho pitbull, dormia atravessado na cama, deixando para mim espaço suficiente apenas para eu ficar de lado, na beira da cama. Deve ter sido assim a noite toda: em vez de dormir, brinquei inconscientemente de equilibrista, o que explicaria meu cansaço.

    Nos últimos anos, Pompom experimentou uma verdadeira revolução em seu status social familiar. Quando foi adotado, tinha acesso apenas a um pátio e um quarto, para se abrigar nos dias frios. Com o tempo, simpático que é, conquistou o direito de abrir a porta do quarto e circular por outros cômodos. Há três meses, com a morte de Dodivânia, a líder de minha matilha, ganhou acesso ao nosso quarto. Agora, virou o dono do pedaço.

    Ilustração Tiago Elcerdo

    Quando chego, à noite, ele segue meus passos com os olhos até que eu abra a porta do quarto. Sai correndo de onde estiver, pula na cama e se esfrega de costas em edredons e travesseiros, como se precisasse espalhar por tudo o seu delicioso cheirinho. Não desce mais. Fica esperando que eu me deite e, com o focinho, levanta as cobertas até conseguir se encostar todinho em mim. Ganho duas lambidas no rosto e, em minutos, ele está roncando.

    Embora eu adore esse jeito de Pompom e o considere carinhoso e especial, tenho de admitir que todo esse ritual não resulta de uma inteligência singular nem de nosso incontestável vínculo afetivo, mas, sim, do mais genuíno instinto canino. Cães são seres sociais. Na natureza, quando a noite cai, eles se aproximam uns dos outros para se manter quentes e seguros. Agora, trazidos para dentro de casa, reproduzem o mesmo ritual com os novos membros de sua matilha.

    Não bastasse a companhia, as camas humanas também oferecem mais espaço (nelas, os cães podem se espreguiçar e rolar) e são mais distantes do chão. No mundo canino, altura é poder. E dormir na cama do dono dá ao cão uma exata noção de seu privilegiado status familiar.

    Esse é agora o meu mais recente problema: Pompom já não tem dúvida de que é o dono da casa.

    sílvia corrêa

    Formada em jornalismo e veterinária. Atuou por 13 anos na Folha. Co-autora de 'Medicina Felina Essencial' (Equalis) e 'A Caminho de Casa' (Ed. de Janeiro). Escreve aos domingos.

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