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    Silvia Corrêa

    Tu vives, ela vive, nós respeitamos

    24/01/2016 02h01

    Minha irmã mora em uma cidade capixaba onde cães são criados no quintal, muitas vezes sem muros. Dividem com os cavalos o pasto, as ruas de terra, a atenção e os parasitos. Foi nesse ambiente bastante rural que minha sobrinha bateu o pé para adotar uma cachorrinha quase de colo.

    Sophie, vira-latinha de lhasa apso, chegou com poucos meses. Exigia cuidados que as pessoas por lá não estão habituadas a dispensar a animais. Mas a adoção fora autorizada sob a condição de que minha sobrinha arcasse com o trabalho.

    Alguns meses se passaram até aquele domingo; ao telefone, minha irmã pedia para eu adotar Sophie. Estava exausta das travessuras, dizia, dos xixis fora de lugar e do choro noturno, além das constantes discussões com a filha. A menina, então com sete anos, não estava cumprindo sua parte no combinado.

    Ouvi. Disse que receberia Sophie, mas que discordava de sua decisão. Primeiro, pelo óbvio motivo de que a mensagem à criança estava cheia de vícios. Em resumo: comprometa-se com algo, não cumpra a sua parte, e eu resolverei para você.

    Ilustração Tiago Elcerdo

    Segundo, porque cães precisam de tempo. Não são objetos que meramente passamos adiante quando não se encaixam na nossa expectativa, não gostamos do visual ou do tom que deram à sala. Cães estabelecem vínculos. A separação seria dolorida para Sophie e para a menina. Uma dor, a meu ver, desnecessária.

    E mais: eu não a devolveria anos depois, quando elas vissem como a cachorrinha cresceu linda e esperta. Pois, como já dissera, cães não são objetos e estabelecem vínculos.

    Sophie nunca embarcou. Isso tudo foi há quatro anos. No período, fotos da família em redes sociais sugeriam que a vida entrara nos eixos.

    No final de semana, veio a notícia: ela está prenhe. Decidiram que será mais feliz se tiver companhia e deixaram que cruzasse. Discordo uma vez mais: em região de tantos errantes, bastava adotar mais um.

    Mas minha irmã pedia dicas para garantir uma gestação saudável à cachorra, hoje a princesinha da casa. Uma guinada e tanto! Agora, o desafio virá em dose tripla.

    sílvia corrêa

    Formada em jornalismo e veterinária. Atuou por 13 anos na Folha. Co-autora de 'Medicina Felina Essencial' (Equalis) e 'A Caminho de Casa' (Ed. de Janeiro). Escreve aos domingos.

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