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    Suzana Herculano-Houzel

    A magia da leitura

    28/04/2015 02h00

    Eu adoro histórias de realismo fantástico e de fantasia, onde as limitações do mundo real não valem, e de preferência as regras da física e da biologia são quebradas de maneiras menos óbvias do que com meros vampiros ou zumbis.

    Os livros e contos da norte-americana Laini Taylor, autora da série "Feita de Fumaça e Osso", estão entre meus favoritos do momento.

    Depois de passar o dia tentando entender como cérebros são construídos e funcionam, deixar-me levar por ficção que se propõe apenas a contar histórias que desafiam a imaginação é deliciosamente refrescante.

    É sabido que apreciar ficção, sobretudo a literatura fantástica, requer "suspensão da descrença", ou seja, calar momentaneamente aquelas partes do cérebro que ficam dizendo "isto não é possível".

    A leitura sobre mundos mágicos é diferente da participação como plateia de shows de mágica, onde ficamos mesmerizados tentando entender como as regras da física parecem ter sido momentaneamente revogadas, mas não foram. Ver "mágica" só acirra nossas descrenças.

    Mas ao ler fantasia, aceitamos que é assim e pronto. Como a leitura de fantasia faz sua própria mágica no cérebro?

    Um grupo de pesquisadores na Universidade Livre de Berlim resolveu responder essa pergunta pedindo que voluntários lessem, dentro de uma máquina de ressonância magnética funcional, trechos sobrenaturais, com violações das leis da física, e trechos perfeitamente mundanos dos mesmos livros.

    Quais livros? Os de Harry Potter, claro, que comprovadamente funcionam no cérebro dos leitores, já que ele se tornou o provavelmente mais conhecido e querido dos personagens modernos de ficção fantasiosa.

    Os pesquisadores descobriram que, além de ativar as partes do cérebro que monitoram violações das regras do mundo, a leitura dos trechos em que objetos voam e pessoas aparatam e desaparatam causa maior ativação da amígdala cerebral esquerda, e com isso mais sentimentos de surpresa e de prazer, do que a leitura dos trechos mundanos.

    Os trechos mágicos também aumentam a ativação de partes do córtex cerebral associadas à atenção, talvez recrutadas pela própria ativação da amígdala.

    Ler textos fantásticos traz surpresa e prazer ao cérebro, que fica atento, querendo mais. Mas desta parte eu já sabia...

    suzana herculano-houzel

    Carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha.
    Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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