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    Suzana Herculano-Houzel

    Macacadas com dinheiro

    04/08/2015 02h00

    Nós humanos gostamos de pensar que somente um cérebro tão avantajado como o nosso deve ser capaz de lidar com conceitos abstratos como dividendos e debêntures, necessários para transações financeiras complexas. Até o conceito de dinheiro –um objeto que só tem valor se houver um consenso arbitrário sobre ele– deve ser elaborado demais para donos de cérebros menores. Ou não?

    A psicóloga Laurie Santos, da Universidade Yale, há alguns anos instituiu um "mercado macacal" para estudar que tipos de decisões macacos tomariam com dinheiro nas mãos. A resposta? Macacos tomam decisões financeiras surpreendentemente semelhantes às que nós tomamos.

    Vamos começar do começo. Macacos aprendem o conceito de dinheiro entregando fichas não comestíveis e nada interessantes a mãos humanas para serem trocadas por pedaços de frutas secas. Eles preferem entregar suas fichas a humanos que oferecem "promoções" do tipo 2-por-1; roubam fichas uns dos outros e até dos pesquisadores; e também trocam fichas entre si por... sexo.

    Mais surpreendente, no entanto, são as decisões econômicas mais complexas, envolvendo riscos, tomadas pelos macacos. Face a um humano que entrega sempre uma uva pela ficha, e um segundo humano que metade das vezes entrega duas uvas e metade das vezes, nenhuma, os macacos preferem entregar suas fichas ao primeiro "vendedor" –embora o retorno econômico, no fim das contas, seja o mesmo em total de uvas. Um ganho certo é preferível ao risco de não ganhar nada.

    Mas, ao contrário, os macacos preferem o risco de uma perda maior à certeza de perder só um pouquinho: entregam suas fichas ao "vendedor" incerto, que oferece duas uvas mas ora entrega as duas, ora nenhuma, e não ao vendedor consistente que oferece duas e sempre entrega apenas uma.

    Em todos os casos, o retorno é semelhante: em média, fica-se sempre com uma uva por transação. Se não faz sentido preferir um vendedor ao outro, faz ainda menos sentido preferir a segurança do ganho mas o risco da perda. Irracional, certo?

    Sim –e exatamente tão irracional quanto nós. O comportamento econômico dos macacos é uma reprodução fiel do comportamento econômico humano, movido por avidez por recompensas, mas repulsa por perdas. Para o cérebro, perder e ganhar não são dois lados da mesma moeda, e sim duas balanças diferentes.

    suzana herculano-houzel

    Carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha.
    Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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