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    Suzana Herculano-Houzel

    Quem precisa de mais cérebro?

    01/03/2016 02h00

    Em visitas recentes a museus de história natural, tenho curtido admirar esqueletos de dinossauros. Quanto mais gigantescos, mais tempo passo olhando as proporções do corpo e ponderando uma de minhas questões favoritas do momento: o que precisa acontecer para surgirem espécies novas maiores do que as anteriores?

    Em particular, o que acontece com o sistema nervoso, o conjunto de estruturas que mantem o corpo operando de maneira integrada? Animais maiores precisam de cérebros maiores para operar seus corpanzis?

    Ao longo das últimas décadas, o consenso e a intuição diziam que sim. Afinal, animais maiores possuem cérebros também maiores -e apenas fazia sentido que mais corpo requeresse mais neurônios para processar as informações sensoriais de uma superfície corporal maior, e para controlar mais músculos.

    Mas, como tantas coisas que temos investigado, essa era mais uma intuição razoável porém não fundamentada em fatos. O que diriam números reais sobre a questão?

    Meu colega Paul Manger e eu resolvemos estudar crocodilos, que, como dinossauros, crescem ao longo de toda a vida. Se corpos maiores exigem mais cérebro para cuidar deles, então crocodilos maiores deveriam ter cérebros maiores e também com mais neurônios.

    Comparamos 25 animais de 90 g a 90 kg, adquiridos de uma fazenda na África do Sul, pesamos seus cérebros e contamos seus neurônios. Os resultados acabaram de sair na revista "Brain, Behavior and Evolution".

    Descobrimos que todas as partes do cérebro de crocodilos maiores se tornam, sim, maiores conforme os animais crescem. Por todo o cérebro, neurônios e outras células aumentam de tamanho, e algumas estruturas de fato ganham mais neurônios.

    Mas justamente aquelas estruturas conectadas diretamente ao corpo não ganham neurônios: os números que encontramos ali eram semelhantes em indivíduos pequenos ou gigantescos. Um corpo maior, portanto, não requer imperativamente mais neurônios para operá-lo.

    Aliás, nem são precisos muitos neurônios. Mesmo no maior dos nossos crocodilos, o cérebro não era maior do que meu polegar -e o número de neurônios era menor do que num cérebro de rato.

    Não é à toa que, quando estudantes vêm ao laboratório nos visitar, o cérebro mais popular não é o da girafa ou o da baleia rorqual. O campeão de audiência é o cérebro diminuto do maior dos crocodilos.

    suzana herculano-houzel

    Carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha.
    Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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