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    Suzana Herculano-Houzel

    Mecanismo do efeito placebo é o mesmo que responde ao prazer

    11/10/2016 02h00

    Oonagh Taeger/Flickr
    A pílula inerte surte efeito em boa parte dos casos: é o efeito placebo
    A pílula inerte surte efeito em boa parte dos casos: é o efeito placebo

    Quando se deseja determinar o efeito de um medicamento sobre uma condição médica –dor de cabeça ou depressão, câncer ou gripe–, o padrão-ouro é compará-lo ao efeito de uma pílula inerte, feita de substâncias sem ação específica ou curativa, como farinha ou açúcar. Pílulas e chazinhos inócuos, bem como algodão na testa, também podem ser administrados apenas para atender ao paciente (ou seus familiares), donde seu nome clínico: placebos, do termo em latim para "vou agradar".

    O problema, contudo, é que, em comparação ao resultado de nenhum tratamento, a pílula inerte surte sim efeito em boa parte dos casos: é o efeito placebo, hoje bem conhecido da medicina e responsável pela longevidade da homeopatia e várias "curas para a gripe".

    Aqueles contrários à alopatia usam incorretamente o efeito placebo como indicação da taxa de "cura espontânea" para diminuir a relevância e eficácia dos tratamentos farmacológicos. Mas não deviam. O efeito placebo é real, e vem de dentro: do cérebro da pessoa que recebe o agrado, cria expectativas positivas de melhora –e aumenta a capacidade do seu próprio sistema imunitário para debelar o problema.

    Há algum tempo a neurociência sabe que receber um placebo ativa o sistema de recompensa, aquelas estruturas do cérebro que registram ações bem-sucedidas e premiam corpo e cérebro com uma sensação de prazer. Até recentemente, contudo, acreditava-se que essa ativação daria apenas conforto psicológico.

    Mas um estudo israelense publicado na "Nature Medicine" mostrou que a ativação direta do sistema de recompensa é suficiente para aumentar a imunidade do corpo. O estudo, liderado por Asya Rolls, no Instituto de Tecnologia de Israel, mostrou que camundongos que tiveram especificamente o sistema de recompensa ativado por uma droga tinham monócitos e macrófagos mais capazes de eliminar bactérias injetadas no sangue do animal, mais anticorpos circulantes, e uma reação inflamatória duas vezes mais forte quando reexpostos às bactérias. A imunidade aumentada pela ativação do sistema de recompensa tem como intermediário o acionamento do sistema nervoso simpático, que inerva diretamente todos os órgãos do sistema imunitário.

    Que sentido faz aquilo que dá prazer também aumentar a imunidade do corpo? Como observa Asya Rolls, nossas fontes mais elementares de prazer –sexo e comida– também são as atividades que mais nos expõem a patógenos. Não é coincidência, então, o que dá prazer também fazer o corpo aumentar o combate aos patógenos que o prazer traz.

    suzana herculano-houzel

    Carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha.
    Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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