• Colunistas

    Saturday, 27-Apr-2024 17:00:11 -03
    Suzana Herculano-Houzel

    O alto preço de ser rei da selva e como cães têm mais neurônios do que gatos

    05/12/2017 02h00

    Gabriela Di Bella/Folhapres
    Uma leoa tem menos neurônios corticais do que um golden retriever
    Uma leoa tem menos neurônios corticais do que um golden retriever

    Minha praia é diversidade biológica, em particular do ponto de vista do sistema nervoso, e acabamos de publicar um novo estudo mostrando de quantos neurônios são feitos cérebros, desta vez de espécies de carnívoros.

    A Universidade Vanderbilt, que tem um escritório de comunicação dedicado a promover seus pesquisadores, fez um vídeo como parte do press release - e a mídia adorou, sobretudo a parte sobre cães terem mais neurônios do que gatos.

    O assunto é convidativo, eu bem sei, e a pauta rapidamente viralizou a ponto de ser comentada no programa humorístico Saturday Night Live.

    Como neurônios são as unidades de processamento de informação do cérebro, quanto mais neurônios, maior deve ser a capacidade cognitiva de um cérebro, sobretudo no córtex cerebral. Esta é a parte do cérebro que, por receber uma cópia de todos os sinais em trânsito pelas outras estruturas e poder combiná-los, torna animais capazes de muito mais do que detectar estímulos e responder a eles.

    É o córtex cerebral que permite detectar padrões, tomar decisões moduladas por experiências passadas, e planejar estratégias para alcançar objetivos –tudo aquilo que torna o comportamento complexo e flexível.

    Portanto, quanto mais neurônios tem o córtex cerebral de uma espécie, mais cognitivamente capaz ela deve ser.

    Enquanto não sabemos como comparar capacidade cognitiva entre espécies, temos a expectativa pautada no número de neurônios corticais.

    E cães têm cerca de o dobro de neurônios no córtex cerebral do que gatos. Quem ama cachorros vibrou, quem ama gatos...bom, até que se comportou bastante bem; foram só dois telefonemas emburrados até agora.

    Não deu o mesmo ibope, é pena, a parte mais bacana do estudo.

    Nossa expectativa inicial era que leões talvez tivessem mais neurônios corticais do que suas presas, animais igualmente grandes como antílopes, por causa de pressão seletiva a favor de maior capacidade cognitiva para caçar (supostamente mais difícil do que apenas correr, nós imaginamos).

    Mas não: o cérebro de uma leoa tinha menos neurônios corticais do que o cérebro de um golden retriever de quase metade do tamanho. Pior ainda: o cérebro do urso pardo, de quase dez vezes o tamanho do cérebro do gato, tem apenas tantos neurônios quanto este no córtex cerebral.

    Minha suspeita é que ser um predador enorme não é lá tão fácil quanto se supunha. Correr atrás da caça é tão custoso em termos de energia que esses animais dispensam perseguir bichinhos pequeninos, e se viram com os neurônios corticais que conseguem sustentar. Ser grande custa caro...

    suzana herculano-houzel

    Carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha.
    Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024