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    Suzana Singer

    #nãofaçanadaestúpido

    19/02/2012 03h30

    Estreia do Corinthians na Libertadores, quarta-feira passada. Sai o primeiro gol, do Deportivo Táchira, já no primeiro tempo. No Twitter, um jornalista da Folha comemora: "Eu disse que o ano ia começar a ficar divertido. (Agora só falta a obra do estádio desabar)"

    Reação de um seguidor: "Torcer contra, beleza; tirar sarro, tudo bem; pedir por uma tragédia é coisa de imbecil".

    Resposta: "Ui".

    O diálogo retrata bem os perigos das mídias sociais. Basta pensar e teclar. Talvez nem precise pensar... Em apenas 140 caracteres, dá para ofender a segunda maior torcida do Brasil, desejar um acidente e desdenhar de um leitor.

    No dia seguinte, foi a vez de um apresentador da Rede Globo, que tem 1,5 milhão de seguidores, soltar impropérios na internet. Ele xingou de "babaca", "otário", "tribufu" e "retardado" quem o provocou.

    É a festejada interação jornalista/público que Twitter, Facebook & cia. permitem hoje. Não se trata de negar os ganhos que essas novas mídias trouxeram à reportagem: ficou fácil medir a repercussão de determinados assuntos, recolher sugestões de pauta, fazer contato com especialistas e obter informações de pessoas que vivem sob ditaduras ou em situações extremas.

    O problema é administrar o caos. As redes sociais vivem do imediatismo (não há a mediação de um editor), da mistura do pessoal/profissional e da egolatria.

    As principais empresas de comunicação estão discutindo adendos aos seus códigos de conduta, numa tentativa de colocar baias seguras, mas eis uma tarefa insana.

    A SkyNews baixou, no último dia 7, uma orientação que proíbe os jornalistas de retransmitir mensagens que não sejam produzidas pela Redação. É uma tentativa de evitar a propagação de notícias falsas ou que fujam dos padrões editoriais da empresa, mas também de impedir que se faça propaganda dos concorrentes na internet.

    Na BBC, a nova orientação é não mais correr para o Twitter sempre que houver uma informação nova. A prioridade é avisar a chefia da Redação, numa forma de restabelecer o controle sobre os repórteres.

    Nos EUA, a CNN suspendeu, no último dia 8, um comentarista que, também movido pela adrenalina do esporte, tuitou uma mensagem considerada homofóbica: "Se um cara vai na sua casa ver o Super Bowl e fica todo animado com a propaganda de cueca do David Beckham para H&M, encha ele de porrada".

    No comunicado em que anuncia a suspensão, a CNN ressalta que aquele tipo de linguagem não é compatível com os "valores e a cultura da organização".

    Na Folha, as regras são muito genéricas, dizem apenas que o jornalista deve evitar:

    1) manifestar posições partidárias e políticas;

    2) antecipar reportagens que serão publicadas ou divulgar bastidores da Redação, a menos que seja decisão do jornal;

    3) emitir juízos que comprometam a independência ou prejudiquem a imagem da Folha;

    4) o jornalista deve agradecer a eventuais críticas e indicações de possíveis erros e encaminhá-las ao superior hierárquico.

    Sobre o caso do jornalista que torceu contra o Corinthians e o seu estádio, a Secretaria de Redação avalia que o profissional violou o item 3 do código acima, ou seja, prejudicou a imagem do jornal.

    Assegurar a presença da marca Folha nas mídias sociais, que muitos creem vitais para o futuro da imprensa, e não perder a identidade é um tremendo desafio. Regras demais podem tornar as mensagens anódinas a ponto de parecerem despachos de agências de notícias.

    Mas talvez um quinto mandamento, retirado do guia de mídia social da BBC, fosse útil por aqui: "Todas as recomendações podem ser resumidas em: 'não faça nada estúpido'".

    suzana singer

    Escreveu até abril de 2014

    Foi a ombudsman da Folha por quatro anos, de abril de 2010 a abril de 2014. No jornal desde 1987, foi Secretária de Redação na área de edição, diretora de Revistas e editora de "Cotidiano".

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