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    Tati Bernardi

    Quem casa quer... encher o saco

    18/09/2015 02h00

    Uma amiga da época da escola vai se casar agora em outubro. Não a vejo há pelo menos uns 20 anos. Mentira, acho que cruzei com ela uma ou outra vez, mas quero dizer: não sou amiga dela há 20 anos. Aliás, eu nem era muito amiga dela quando era amiga dela. Só pra vocês entenderem, nem no Facebook eu tinha aceitado a criatura. Em suma: não fez nenhum sentido chegar pra mim um convite de casamento.

    Mas a coisa piora muito. O casamento é na Bahia, numa daquelas praias que você pega avião, ônibus, táxi, balsa e jangada pra chegar. E ainda tem mais um tanto a pé. Era mais fácil casar na Rússia. Ou seja: além de gastar com o presente, você tem que gastar com passagem, mais 123 meios de transporte, hospedagem e alimentação (ou você enfia 23 bem-casados na bolsa e fica se alimentando deles os outros dias, porque ninguém vai tão longe pra ficar um dia só). Fora as cartelas de ansiolítico pra suportar tudo isso. Fora as picadas de insetos. Fora as manchas na pele depois das picadas, porque eu mancho fácil. Fora o vestido "é casamento, mas é durante o dia e na praia" que você acha que tem, mas não tem e vai ter que comprar. Fora o sapato "é na areia, mas é casamento" que você acha que tem, mas não tem e vai ter que comprar.

    E a coisa segue piorando. ANTES do casamento ainda tem chá de cozinha, chá de lingerie e despedida de solteira. E para todos esses eventos, é claro, você gasta mais dinheiro e mais tempo e mais cartelas de ansiolítico pra suportar tudo isso. É basicamente como se a pessoa, que nem é sua amiga (e nunca foi e, vamos combinar, nem poderia ser porque já ficou claro que ela é mala, confere?), te pedisse pra você parar dois meses da sua vida e se dedicar inteiramente a ela. Apenas porque ela decidiu casar. "Gente, tô casando, esquece crise do país, esquece sua vida privada com suas ocupações e angústias e afazeres, esquece que você nem gosta de mim e eu nem gosto de você e FOCO na noiva."

    Óbvio que eu não vou. E nem vou mandar presente. Geralmente, por educação, ao menos deposito lá uns R$ 145 pra fofa gastar na sua viagem dos sonhos. Pelo menos já entenderam que pedir dinheiro pra viajar pra Tailândia é menos imbecil que um site cheio de lixeiras e caçarolas com tampa. Escolho a opção menos brega entre "noite estrelada em bangalô" e "dar banho no elefante cagado" e sempre tenho certeza que meu dinheiro vai acabar na compra de um shortinho na lojinha do hotel.

    Mas nesse caso não vou dar nadinha. Ela não merece. Ela fez comigo o que não se faz nem com o pior inimigo. Ela me colocou no grupo de WhatsApp do chá de lingerie. O grupo chama "pra apimentar esse amor". Esse nome me fez ter vontade de me cortar em sete lugares diferentes, mas eu tive por mim o que essa futura esposinha mongobila não teve: compaixão. Gata, se você não tem maturidade pra dar conta de suas próprias calcinhas, você não deveria assinar nenhum documento. Posso fazer um grupo de WhatsApp chamado "intervenção na sem noção" e convidar as mesmas pessoas?

    E que prêmio o convidado ganha depois de gastar meio salário pra atravessar o sertão e ver uma ex-não-melhor-amiga chatola casar com um coxa? Fotos do casal no telão! Ah, como foi bom em Bariloche! E quando a tia Cidinha, já munida de antenas neon e óculos pink, gritar "Eu não acreditooo" ao tocar "I Gotta Feeling", você terá, ainda que bêbado, vontade de morrer. A vida é muito chata, mas essas pessoas que dão trabalho quando casam são ainda mais insuportáveis que a própria vida.

    tati bernardi

    É escritora, redatora, roteirista de cinema e televisão e tem quatro livros publicados. Escreve às sextas.

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