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    Tostão

    Festanças e protestos

    DE SÃO PAULO

    02/02/2014 01h18

    No domingo passado, o jornal "O Globo" publicou uma matéria sobre o aquecimento, nesta época, da venda de materiais (bolas, camisas e outros) relacionados com a história do futebol brasileiro.

    Segundo a reportagem, uma bola da Copa de 1966, com o meu autógrafo e os de Pelé, Rivellino e Djalma Santos, será leiloada por colecionadores. Já dei dezenas de autógrafos em bolas.

    Não me lembro desta. Rivellino não esteve na Copa de 1966. Deveria ter ido.

    Uma das camisas que Pelé usou na final da Copa de 1970 foi leiloada, tempos atrás, por R$ 530 mil, na famosa loja Christie's, de Londres. No mesmo local, foi vendida uma coleção de camisas famosas, que pertencia a Zagallo, apaixonado pela amarelinha. Na coleção, tinha outra camisa que Pelé usou na final contra a Itália.

    As pessoas deveriam ter mais cuidado sobre a autenticidade de peças antigas. Deve haver umas 500 camisas e bolas que foram usadas em Copas do Mundo.

    Anos atrás, recebi um telefonema de Londres, perguntando se eu poderia reconhecer a autenticidade de uma bola com o autógrafo dos campeões do mundo, que tinha sido usada na final da Copa de 1970 e que eu tinha dado de presente. Os autógrafos e a oferta eram verdadeiros, mas era uma bola de treino. Obviamente, não concordei.

    Se alguém estiver curioso para saber onde estão as camisas que joguei a final no México, dei a do primeiro tempo ao médico Roberto Abdala Moura, presente no estádio, que tinha me operado do descolamento de retina, oito meses antes da Copa. A do segundo tempo, muitos sabem, me foi arrancada do corpo, junto com as meias, chuteiras e calção, segundos após o árbitro terminar o jogo. Fiquei apenas de sunga. Se não fossem os policiais, teria ficado nu.

    Daqui até o fim da Copa, além de muitos leilões e de milhares de comerciais sobre a seleção e o Mundial, geralmente ufanistas, haverá dezenas de festas, eventos, solenidades, promovidos pela Fifa, pela CBF, pelos patrocinadores e por tantos que querem faturar. A festança terá de conviver com as inevitáveis manifestações de rua, sem violência, contra a gastança e o desperdício de dinheiro público.

    Como fui campeão do mundo, já recebi alguns convites para as festas. Se aceitasse, teria, provavelmente, de colocar na camisa o nome do patrocinador ou com os dizeres: "Brasil, ame-o ou deixe-o". Teria ainda de falar bem da Fifa, da CBF, do governo, sempre com um largo sorriso. Os cachês são altos, uma tentação.

    Nesses dias, vi um documentário, na Globo News, sobre o poeta Manoel de Barros, que sempre viveu no Pantanal. É um dos meus ídolos. Ele disse que pagou para ser poeta 24 horas e para ter direito ao ócio criativo.

    Também pago ao recusar convites remunerados e alguns prêmios, para tentar manter a coerência e a independência para opinar.

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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