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    Tostão

    Sermão do vestiário

    11/02/2015 02h00

    No início do ano, estive de férias na Colômbia, em Bogotá, que não via desde a época de atleta, e na belíssima e histórica Cartagena, onde encontrei com Gabriel Garcia Márquez, presente no imaginário dos colombianos e dos visitantes. A Colômbia, apesar dos graves problemas sociais, vive, diferentemente do Brasil, um clima de otimismo, pela enorme diminuição da violência urbana e pelo futebol, já que a seleção, pela primeira vez, chegou às quartas de final de uma Copa.

    Um motorista de táxi lamentou apenas que a seleção principal não ganha do Brasil. Ocorre o mesmo com os chilenos. Na Copa, o Brasil eliminou as duas. Mas, no Sul-Americano sub-20, os colombianos deram um show no Brasil (3 a 0). Ficaram em segundo lugar (eram os campeões), e o Brasil, em quarto. Se continuar pelo mesmo caminho, não será surpresa se, no futuro, a Colômbia se tornar melhor que o Brasil no futebol e no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).

    Assim como acontece em quase toda a América do Sul, a seleção colombiana é forte, e os times, fracos, por causa da exportação dos melhores atletas. O Once Caldas não está no nível das principais equipes colombianas, nem do Corinthians. Mesmo assim, se não fosse o gol de sorte de Emerson, no primeiro minuto (cruzou, e a bola entrou), e o erro do árbitro ao invalidar um gol do Once Caldas, quando estava 1 a 0 para o Corinthians, a vitória não seria tão fácil, e o jogo de hoje teria riscos.

    O Corinthians já está classificado. Ou deveria dizer praticamente classificado?

    A violência e a fraca seleção sub-20 me deixam mais preocupado com o futebol brasileiro. Obviamente, os treinadores não são os únicos responsáveis pela queda de qualidade, mas não precisam ser tão corporativistas ao exaltar a eficiência da classe. Com isso, continuam supervalorizados e com altíssimos salários, incompatíveis com a realidade de nosso futebol.

    A péssima gestão dos clubes, a promiscuidade nas relações profissionais, a estrutura ultrapassada e vários outros fatores não excluem a responsabilidade dos técnicos. São eles que escolhem os jogadores e a maneira de atuar.

    Enquanto o mundo incorporou o estilo de troca de passes do Barcelona, respeitando as variações de cada país e de cada treinador, diminuiu a violência dentro e fora de campo, passou a jogar um futebol mais agradável, mais limpo, mais coletivo, e, com isso, melhorou o espetáculo e teve mais lucro, o Brasil foi por outro caminho, o do excesso de chutões, faltas, lances individuais e jogadas aéreas. Falo isso há longo tempo.

    O futebol brasileiro começou a mudar, recentemente, lentamente, com a maioria dos treinadores seguindo o modelo das melhores equipes do mundo. O caminho é longo e só terá êxito se houver também transformações fora de campo.

    Sermões nos vestiários, feitos por treinadores e jogadores, como o do pastor Zé Roberto, são bem intencionados, às vezes, têm ótimos resultados momentâneos, mas são tentativas de encobrir as deficiências individuais e coletivas. Refletem também o atraso de nosso futebol.

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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