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    Tostão

    Podridão escancarada

    31/05/2015 02h00

    As últimas décadas foram o tempo do enorme aumento dos megaeventos e das transações comerciais ligadas ao futebol e também das propinas e da corrupção. O esquema é muito parecido com o descoberto pela Operação Lava Jato. A investigação vai se aprofundar e chegar às perniciosas relações no futebol brasileiro, protegidas, durante esse longo tempo, pelo álibi de que são entidades particulares.

    O empresário J. Hawilla, antigo parceiro da CBF, repórter na época em que eu jogava, confessou a culpa e já está pagando quase R$ 500 milhões para diminuir a pena. Já imaginou o quanto deve ter faturado?

    Em 1999, quando trabalhava na TV, cheguei ao Paraguai, junto com os companheiros, para a cobertura da final da Copa América, entre Brasil e Uruguai. O Brasil foi campeão, e Luxemburgo era o técnico. Havia um enorme tumulto no hotel que hospedava o time brasileiro, dirigentes, empresários, imprensa e torcedores. Não dava nem para chegar à recepção. Apareceu J. Hawilla e disse que qualquer problema ele resolveria, com jeito de dono da competição, do hotel, do futebol e do mundo. Por causa da globalização e da frequente associação de empresas, pensei, à época: "Será que ele é meu patrão, e eu não sei"?

    Enquanto isso, a bola rola. Em minha tentativa de entender a queda do futebol brasileiro, lembro que o Brasil sempre teve, desde os anos 1950, excepcionais laterais, que se destacaram pelo apoio ao ataque, como Nilton Santos, Carlos Alberto, Roberto Carlos, Júnior, Jorginho, Leandro e tantos outros. Os adversários estudavam como marcá-los. Tornaram-se uma marca de qualidade do nosso futebol.

    Por causa do avanço de todos os laterais, os excepcionais e os ruins, os times passaram a ter um volante de cada lado, para fazer a cobertura, além de um terceiro, à frente ou entre os zagueiros. Criou-se uma grande dependência ofensiva dos laterais e de um único meia-de-ligação. Além disso, proliferaram os volantes brucutus, que só desarmavam, e os laterais medíocres, que só corriam e cruzavam a bola na área.

    Desapareceram a troca de passes, as triangulações, os dribles e as tabelas. A saída de bola da defesa passou a ser feita por chutões. Com isso, aumentou muito o número de meias e atacantes velozes, mas sem técnica e lucidez. Predominavam os lances individuais, isolados, esporádicos. O excesso de passes errados não é apenas por falta de técnica, mas também pela pressa de jogar a bola para frente, na área, para o companheiro marcado. A bola vai e volta.

    Nos últimos anos, vários treinadores, com novas ideias, tentam mudar, mas encontram grandes dificuldades, por causa dos vícios acumulados ao longo do tempo. Além disso, muitos sabem o que fazer, mas não sabem como fazer.

    As atuações das equipes, de todos os países, na Libertadores, mostram o equilíbrio e o baixo nível técnico, com exceção do baile que o River deu no Cruzeiro, após tantos jogos ruins do time argentino. O mediano Rafael Sóbis é o grande destaque do Tigres, do México, um dos quatro semifinalistas. Como diria José Trajano, parei!

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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