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    Tostão

    Fragmentado e confuso

    24/01/2016 02h00

    Passei as minhas férias em Belo Horizonte. Troquei os noticiários da televisão, com tantas tragédias e corrupções, e os milhares de jogos e de programas esportivos pela leitura, especialmente de romances, pelos filmes e programas de arte de algumas emissoras, pelas caminhadas em uma cidade menos barulhenta nesta época, pela tentativa de terminar um livro sobre futebol e pelo não fazer nada, o que mais fiz.

    Como não dá para não ver as partidas do Barcelona e do Real Madrid e como ficava curioso para saber as novidades sobre quem chega e quem sai dos clubes, de vez em quando, ligava a TV nos programas de esporte.

    Os times brasileiros, mesmo com enormes dívidas e deficits, contratam demais e pagam absurdos salários a jogadores comuns e a treinadores. Os elencos são enormes, com muitos atletas encostados, que, quando entram, atrapalham.

    Chegam mais para subtrair que para somar, como os atletas gostam de dizer.

    Vamos ter três línguas no futebol brasileiro, o português, o espanhol e o portunhol. Os clubes e os treinadores acham que todo argentino é raçudo e muito bom. Dizem que já existem na Argentina cursos intensivos para jovens atuarem no Brasil e ficarem ricos.

    Com exceção do Corinthians, que fica pior com a saída de alguns de seus melhores jogadores, embora siga na turma de cima, já que manteve o técnico e dois jogadores da seleção (Cássio e Elias ), os outros clubes devem continuar mais ou menos no nível técnico do ano passado.

    O único jogador que lotou o aeroporto de torcedores em sua chegada foi o decadente Lugano. Ele se destacou na época em que, para ser um bom zagueiro, bastava ser alto, forte, bom no corpo a corpo, gritar muito e jogar com os olhos esbugalhados, de raça. Não precisava ter boa técnica, dar um bom passe nem ter velocidade, pois jogava encostado à grande área, na sobra. Um dos chavões da época era que o zagueiro nunca poderia ficar mano a mano com o atacante.

    O futebol mudou. Mesmo se Lugano tivesse as mesmas condições de dez anos atrás, hoje seria inferior. Porém, como possui liderança e, na média, os zagueiros brasileiros são fracos, ele poderá jogar tanto –ou melhor– quanto a maioria, ainda mais que será dirigido por um técnico que sabe armar bem um sistema defensivo.

    A liderança técnica é o mais importante. É a capacidade de, ao mesmo tempo, atuar e ver o jogo, além de saber dialogar com o treinador e com os companheiros.

    É preciso acabar também com os chavões de que jogador raçudo é o que grita muito, dá broncas e corre atrás de bolas perdidas e que todo jogador habilidoso e clássico é apático quando joga mal e o time perde.

    Onde vai jogar Pato? Escuto, todos os dias, que ninguém discorda de seu enorme talento e que falta a ele apenas a atitude de um craque.

    Discordo. Pato, isoladamente, é habilidoso, criativo e executa bem os fundamentos técnicos. Mas falta o principal para ter um grande talento, a lucidez para tomar as decisões corretas, a capacidade de unir suas qualidades, de juntar as partes e de formar um todo, uma unidade. Em campo, é um atleta confuso, fragmentado, com um grande brilho aqui, outro ali.

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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