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    Tostão

    Clubes inflam elencos com jogadores medíocres, que ficam encostados

    08/01/2017 02h00

    Neste período do ano, eu queria ser um repórter invisível, para escutar todas as conversas sobre as contratações de jogadores e saber os detalhes que não são revelados ou confirmados.

    Com frequência, o desejo de um treinador é diferente do interesse comercial dos clubes. Empresários se tornam muito próximos de treinadores, dirigentes e atletas e influenciam em suas decisões. Alguns só negociam jogadores importantes se os clubes ficarem também com o troco, um atleta medíocre. Há atletas e treinadores de um mesmo clube que possuem o mesmo empresário. Tudo é perigoso, pelo conflito de interesses. Mesmo que os interessados sejam honestos, a ambição humana é imensa.

    Muitos jogadores que fizeram sucesso no início de carreira, que foram para a seleção e para o exterior e que retornam por não haver mais interesse de grandes clubes europeus, voltam para ganhar fortunas, como se estivessem nos melhores momentos. Pior, há muitos, excessivamente valorizados, que nunca foram excepcionais. Os clubes não arrecadam tanto para pagar os altíssimos salários de vários treinadores e jogadores.

    Os clubes inflam os elencos com jogadores razoáveis, medíocres, que ganham bem e que ficam encostados. Quando entram, atrapalham. Falam que vieram para compor o elenco, para somar. A maioria chega para subtrair. Três salários de um medíocre dariam para pagar um de um excelente. Em vez de trazer jogadores ruins, por que não valorizar os bons da base?

    O Palmeiras, que, no ano passado, tinha o melhor time e elenco, é o que tem contratado melhor e também o que mais gasta. O rapidíssimo executivo Alexandre Mattos contrata todos, os bons e os ruins. Se o time for campeão, os gastos com os ruins são relevados.

    Dizem que Conca vai se tratar, durante meses, no Flamengo, e que só vai receber seu milionário salário, como se fosse um Neymar, quando começar a jogar. O jovem e bom técnico Zé Ricardo terá dificuldades de escalá-lo com Diego, pois os dois quase sempre atuaram como meias centralizados, sem participarem da marcação.

    Nelson Perez/Divulgação/Fluminense FC
    https://www.flickr.com/photos/oficialflu/14701124014/Crédito: Divulgação/Fluminense FClegenda: O argentino Conca comemora seu gol diante do Santos em Volta Redonda
    O meia argentino Conca comemora um gol pelo Fluminense

    Entre várias opções, Zé Ricardo pode escalar Conca voltando para marcar, pela direita, e com liberdade de movimentação, como faziam Jádson, no Corinthians, e Éverton Ribeiro, no Cruzeiro, e como faz Philippe Coutinho, na seleção. Mas são situações diferentes. Aquele Corinthians e a atual seleção não atuam com um clássico meia de ligação, como o Flamengo (Diego). Os dois jogam com um volante e dois meio-campistas, que atuam de uma área à outra. No Cruzeiro, o meia Ricardo Goulart era, na prática, um segundo atacante, finalizador. A tendência atual, em todo o mundo, é não depender de um único armador centralizado, ainda mais de dois.

    Muitos comentaristas adoram dizer que é obrigação dos técnicos escalar sempre os melhores —nem sempre é possível— e citam sempre o exemplo da seleção de 1970, que tinha vários meias. Não é bem assim. O time jogava com três no meio-campo, que protegiam os defensores (Clodoaldo, Gérson e Rivellino), e com três à frente (eu, Jairzinho e Pelé). Não existia o clássico meia de ligação, centralizado.

    Como o futebol é um esporte de muita imprevisibilidade, com várias maneiras de jogar bem e de vencer, em que o time pequeno costuma ganhar do grande, todos possuem um álibi para dizer a besteira que quiser. O errado, às vezes, dá certo.

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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