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    Tostão

    Comentários prontos sobre futebol costumam encobrir boas explicações

    08/02/2017 02h00

    GLYN KIRK/AFP
    Gabriel Jesus comemora após fazer gol em jogo do Manchester City
    Gabriel Jesus comemora após fazer gol em jogo do Manchester City

    Os Estaduais começaram com os mesmos problemas de outros anos: gramados e estádios ruins, pouca qualidade técnica, públicos pequenos, violência na arquibancada no jogo do Inter e muitos erros dos árbitros e auxiliares. Atlético-MG, Cruzeiro e Corinthians foram beneficiados em suas vitórias.

    Os mesmos que criticam a longa duração dos Estaduais e o enorme número de partidas no ano das grandes equipes são os mesmos que aplaudem a realização da Primeira Liga. A justificativa inicial de que ela seria um embrião de uma forte liga nacional foi mais uma conversa para boi dormir.

    Uma característica do futebol é o comentário pronto, uma mesma explicação para situações diferentes. Mesmo se for correto, encobre outros motivos, às vezes, mais importantes. É mais fácil ter um comentário pronto.

    Se o Palmeiras não for bem nos primeiros jogos, já está pronto o comentário de que Eduardo Baptista é um técnico pequeno para um elenco tão forte, como se o Palmeiras tivesse um timaço.

    Se Felipe Melo for expulso, já existe o comentário pronto: "Eu já sabia". Ele é muito bom para o nível do futebol brasileiro, mas, nas grandes equipes em que jogou, foi sempre um coadjuvante. No Palmeiras, se sente o grande craque, o grande líder. Daí, sua excessiva agitação em campo e nas entrevistas, querendo mandar em tudo, até na opinião dos jornalistas.

    Se Gabriel Jesus não tivesse jogado bem os primeiros jogos no Manchester City, já estava pronto o comentário de que seria preciso tempo de adaptação. Como brilhou, tiraram da manga outro comentário pronto: o de que craque não precisa de tempo. O futebol é muito maior e mais complexo que nossas explicações.

    Guardiola, antes da estreia de Gabriel Jesus, já sabia que o melhor lugar do atacante seria pelo centro e próximo à área para aproveitar a velocidade de raciocínio e de movimentos, além de ser um bom finalizador. Tite também já sabia disso.

    Outro comentário pronto é o de que o bom e equilibrado Campeonato Inglês é o melhor do mundo, tem um número maior de grandes times, e que o Espanhol é pior e mais fácil de jogar. Já disseram até que Messi e Cristiano Ronaldo fazem tantos gols porque os adversários são muito fracos. As equipes espanholas vão sempre melhor que as inglesas na Liga dos Campeões e na Liga Europa. Real Madrid e Barcelona são superiores, e Atlético de Madrid e Sevilla estão no nível dos grandes times ingleses.

    Os gramados da Inglaterra são tão perfeitos, o público é tão grande, o ambiente é tão espetacular, os jogos têm tanta intensidade, e o campeonato é tão organizado, que até parece que a maioria das equipes é de alto nível técnico.

    Se o São Paulo perder mais alguns jogos, já está pronto o comentário de que Rogério Ceni deveria começar pelas categorias de base. O clube, em vez de ajudar seu ídolo com bons reforços, o prejudica, já que o time é fraco. No jogo contra o Audax, não vi nada novo nem interessante. Se Rodrigo Caio é o melhor zagueiro que atua hoje no Brasil, não deveria jogar de volante, onde é mais um.

    Às vezes, o comentário pronto impede o aparecimento do fato. Antes de ser contratado, já está pronta a análise de que o técnico Fernando Diniz não daria certo em grandes times. Os clubes preferem o técnico que faz tudo igual aos outros e que não corre tantos riscos.

    tostão

    Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
    e aos domingos.

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