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    Valdo Cruz

    Plano de Saúde da Insensatez

    05/02/2013 03h00

    Comecemos pelo final da história. "Estou muito feliz hoje, enfim alguém faz esses planos de saúde cumprirem a sua obrigação."

    Em visível tom de desabafo, essa foi a reação de um funcionário de um hospital brasiliense depois que a Amil resolveu aprovar a internação de meu filho no último sábado à noite, para que ele fizesse no dia seguinte uma cirurgia no braço quebrado.

    Prosseguindo a conversa com o funcionário, ele relatou que é comum os planos de saúde levantarem questionamentos para recusar um procedimento, mesmo que o hospital se enquadre em todos os requisitos. Por qual motivo? Com certeza para economizar. O que ele mais tem testemunhado, disse, é o segurado desistir e aceitar as condições impostas pela empresa seguradora.

    Vamos à história. No último sábado, meu filho teve um acidente andando de bicicleta e quebrou o braço. Fomos ao hospital. Já era final da tarde. Feitas as radiografias, o médico de plantão diagnosticou que era caso de cirurgia. Ligamos para o médico de meu filho. Ele saiu de sua casa e foi até o hospital. Lá, fez o mesmo diagnóstico e sugeriu que, pelo quadro, seria ideal que a cirurgia ocorresse no dia seguinte.

    Meu filho sentia dores. Estava com o braço direito quebrado e com uma luxação no esquerdo. Em sua opinião, ele deveria ser internado, medicado por conta das dores e fazer a cirurgia no dia seguinte.

    Fomos até o departamento de internação. O hospital é conveniado com a Amil. O plano de saúde do meu filho cobre internação e cirurgias. O hospital tinha vaga disponível em apartamento e no centro cirúrgico para o procedimento. Maravilha, tudo certo.

    O médico do meu filho ligou para sua equipe e avisou que teria de fazer uma cirurgia no domingo logo cedo.

    Só que aí começou a novela. Os funcionários do setor de internação estavam fazendo todos os procedimentos de internação, já que no hospital estava tudo OK. Ligou para a Amil e encaminhou o pedido de autorização. Quando o serviço da Amil ligou de volta, avisou que todos os procedimentos estavam autorizados, só que não naquele hospital. Informaram que meu filho teria de ser transferido para um hospital em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília. Argumentamos que não tinha nenhum sentido, o hospital ficava distante de onde estávamos, meu filho sentia dores, estava com a roupa suja pela queda. A resposta foi negativa.

    O departamento de internação do hospital disse que, infelizmente, não teria condições de internar meu filho. Perguntamos se havia algum impedimento do lado do hospital. A resposta foi negativa.

    Relembrando, o hospital tem convênio com a Amil, havia vaga em apartamento e no centro cirúrgico, o plano de saúde do meu filho cobria as despesas, tudo certo.

    Começou, então, uma série de ligações. A mãe de meu filho ligou diretamente para o centro de atendimento da Amil, o departamento de internação do hospital voltou a pedir que a seguradora analisasse o caso. Foi um festival de "espere um momento, vamos localizar o departamento certo", "vamos transferir a ligação", "vamos passar para o funcionário autorizado". E nada de aprovação. Tudo sendo assistido pelo meu filho, com o braço quebrado, sentindo dores.

    O médico do meu filho disse que não havia sentido algum na recusa do plano de saúde. A nosso pedido, ele entrou no circuito, falou com o funcionário da Amil. Eles mantinham a decisão de que meu filho tinha de ser transferido para o hospital em Taguatinga. Depois de muita insistência, muita conversa, ponderações de que todos os requisitos estavam sendo cumpridos, veio enfim a autorização para internação.

    Fico pensando em outras pessoas sem capacidade de argumentação e que acabam aceitando as condições impostas por estes planos de saúde. Teriam de transportar o filho para outro hospital, checar se havia vaga, fazer todo procedimento novamente. Tudo por conta de uma completa insensatez da empresa seguradora. Uma insensatez que, muito provavelmente, está relacionada com questões financeiras.

    Não posso garantir, mas muito provavelmente o hospital em Taguatinga cobra menos, fica mais barato para a Amil. E o paciente? Bem, o paciente, pelo visto, é apenas um número, o da carteirinha.

    Ele que enfrente as condições impostas pelo plano de saúde. Muitos acabam sofrendo com esse tipo de tratamento.

    Ainda bem que algum funcionário mais sensato, do qual não sei o nome, acabou aceitando nossas ponderações e aprovou a internação. E tudo correu muito bem, graças a Deus. Meu filho foi operado, tudo correu perfeitamente, a equipe médica foi maravilhosa e ele já está em casa.

    Voltando ao início, fiquei realmente impressionado com a reação do funcionário do hospital, um verdadeiro desabafo. Por meio dele, penso em todos aqueles que enfrentaram situações semelhantes e não tiveram o mesmo sucesso que nós. Espero que eles, a maioria, estejam muito bem. E que os planos de saúde repensem seus atendimentos. Eles não atendem máquinas, que podem ser transferidas quebradas daqui para ali sem nenhum risco, mas pessoas.

    valdo cruz

    Escreveu até fevereiro de 2017

    Foi repórter especial da Folha. Cobriu os bastidores do mundo da política e da economia em Brasília.

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