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    Vinicius Mota

    Sociedades mornas

    14/10/2013 03h00

    SÃO PAULO - Além de ter detestado a baía de Guanabara --segundo o verso biográfico não autorizado de Caetano Veloso--, o antropólogo Claude Lévi-Strauss inventou uma tipologia para diferenciar os agrupamentos humanos de acordo com sua inclinação pela mudança.

    Sociedades quentes, como as da Europa ocidental, transformam-se constantemente. Sua narrativa é a história. Em contraponto, as sociedades frias, como algumas ameríndias, preservam seus contornos culturais e organizacionais ao longo dos séculos. Sua narrativa são os mitos.

    Entre o quente e o frio, o Brasil fica no meio da escala, morno. Aqui sempre haverá reservas de gelo para neutralizar ou atenuar os vetores flamejantes do conflito e da mudança.

    A batalha cultural típica dos EUA, entre os conservadores e os progressistas, ensaia repetir-se aqui. Mas nosso campo gravitacional macunaímico modera sua belicosidade e embaralha seus pelotões. O que de lá sai guerra aqui chega gincana.

    O Datafolha mostra os brasileiros francamente progressistas na aceitação da homossexualidade, na defesa da proibição do porte de armas e no reconhecimento da falta de oportunidades iguais como causa da pobreza. Maiorias também expressivas, contudo, agrupam-se em torno de ideias conservadoras, como a proibição do uso de drogas, a preferência por tratar como adultos os adolescentes que cometam crimes e a vantagem intrínseca da crença divina.

    Aceita como causa da pobreza, a falta de oportunidades é porém recusada pela maioria como responsável pela criminalidade. É a maldade das pessoas que leva à delinquência.

    Poucos são os temas, como a pena de morte e o papel dos sindicatos, que instilam polarização equilibrada, à americana. Fora disso, as maiorias são folgadas e constantes ao longo dos estratos socioeconômicos.

    É o Brasil de Caetano e de Kassab. Nem quente, nem frio. Nem à esquerda, nem ao centro, nem à direita.

    vinicius mota

    É secretário de Redação da Folha. Foi editor de Opinião (coordenador dos editoriais) e do caderno 'Mundo'.
    Escreve às segundas-feiras.

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