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    Vinicius Torres Freire

    A inflação de Varginha

    08/08/2013 03h00

    Dilme Rousseff disse ontem que tem muito respeito pelo ET de Varginha -estava brincando. Disse também que a "inflação está sob controle" -estava falando sério.

    A presidente esteve na cidade mineira que teria sido visitada por extraterrestres nos anos 1990; a presidente vive em Brasília, que talvez fique no espaço sideral, onde não há inflação.

    A presidente viajava feliz no disco voador do resultado da inflação de julho, praticamente zero. Aproveitou um resultado pontual para detonar críticos que fizeram "o estardalhaço de que tínhamos [governo] perdido o controle da inflação".

    O governo perdeu o controle da inflação. Caso contrário, a taxa de juros não estaria subindo. A presidente acredita mais em ETs do que em inflação.
    Francamente, porém, essa conversa é retórica política barata, tanto de críticos (vulgares) que falaram em descontrole da inflação como do governo, que se passa a discutir tal coisa, como se o problema essencial fosse esse (um fantasma ou um ET superinflacionário, que jamais esteve na cabeça de ninguém sério).

    O problema é muito outro.

    Primeiro. O Brasil está com inflação bem mais alta que a de parceiros comerciais importantes (EUA, Europa etc). Com inflação alta num mundo que apenas não está em deflação devido à torrente de dinheiro dos bancos centrais. Está com inflação relativamente alta para um crescimento decididamente medíocre (menos de 2% ao ano no governo Dilma). Os custos das empresas sobem bem mais que no resto do mundo, o que juntou o insulto da inflação à injúria do câmbio valorizado dos últimos anos, fatores que aleijaram a indústria.

    Segundo. Inflação não é uma estatística extraterrestre. Tem efeitos muito terrenos. O preço da comida subiu muito. Sobe agora a 11,4% em 12 meses, mas em abril subia a 14%, mais que os salários. O povo gasta um pedação da renda em comida. Por isso que, mesmo antes do tumulto de junho, o prestígio da presidente caía.

    Terceiro. Inflação alta acaba em taxas de juros mais altas e gastos maiores com os juros da dívida pública. Inflação mais alta, pois, prejudica pobres por dois caminhos:
    a renda real cai e há mais despesa pública com juros, que vão para os mais ricos.

    Quarto. A inflação não está sob controle porque o governo fez bobagem na política econômica. Os juros a princípio baixaram, uma boa coisa, mas ficariam baixos apenas se o governo limitasse seus gastos, o que não fez, pois tentou anabolizar a economia, que não "bombou", mas ficou cheia de "bomba".

    Quinto. A inflação de serviços está alta, rodando ainda a 8,5% nos últimos 12 meses (a média no governo Dilma é de 8,4%).

    A medida do núcleo da inflação é quase igual à da inflação média nos últimos 12 meses (na medida do núcleo, são "descontadas" variações mais extravagantes dos preços). Isso quer dizer que a inflação é persistente e disseminada devido a custos salariais altos.

    Inflação "descontrolada" ou "bastante controlada", pouco importa o palavrório. O fato é que o Brasil é um país que consegue ter uma inflação relativamente alta com crescimento nanico, fruto de descasos e barbeiragens que vão fazer o país ratear pelo menos até 2015.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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