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    Vinicius Torres Freire

    Broncas no vermelho

    05/11/2013 03h00

    QUASE NINGUÉM acreditava que o governo fosse cumprir sua meta de "poupança" para este ano. O resultado das contas públicas de setembro, divulgado na quinta passada, mal mexeu nas previsões para o balanço de 2013, apesar de horrível. O que está mesmo dando de falar entre o escasso público que se ocupa dessas coisas foi a forte impressão de descontrole.

    Isto é, mesmo o governo não teria lá ideia do tamanho do buraco. Aparecer com a ideia de última hora de controlar os gastos de fato impressionantes com seguro-desemprego apenas reforçou as suspeitas de desorientação. Note-se que os termos empregados nas últimas linhas são uma tradução bem educada de cobras, lagartos e jacarés que têm sido ditos a respeito das contas do governo Dilma Rousseff.

    A meta de "poupança" do governo para este ano é de 2,3% do PIB. Isto é, a diferença entre o que o governo (federal, estaduais, municipais) arrecada e gasta deveria equivaler a 2,3% do PIB, o chamado "superávit primário". "Poupança" vai entre aspas, pois o governo não poupa nada, se considerada a despesa com os juros da dívida. Levando em conta
    esse gasto, o deficit é de 3,3% do PIB (nos últimos 12 meses).

    O governo federal trabalha nas internas com a ideia de fazer um superavit primário de 1,35% do PIB, o resto da meta (os outros 0,95% do PIB) ficando por conta dos governos estaduais e municipais. Nos últimos 12 meses, o governo federal "poupou" o equivalente a 1,3% do PIB; Estados e municípios, 0,4% do PIB. Total: 1,7% do PIB.

    O governo não disse de público e formalmente que vai fazer apenas 1,35% do PIB de superavit primário, não importa o resultado de Estados e municípios (não vai "cobrir a diferença"). Do outro lado, entre economistas do setor privado, a expectativa é que o primário de 2013 não seja lá muito diferente do 1,7% do PIB realizado nos últimos 12 meses.

    Então, desconsiderado o "me engana que eu gosto", de onde vem a bronca? Primeiro: o resultado fiscal pode ficar ainda pior. O governo teria perdido a capacidade de projetar o aumento de certas despesas e jamais teve noção do tamanho da perda de receita devida a reduções de impostos.

    Segundo, o governo não apresentou nenhum plano, nem mesmo discretamente, para ajeitar as coisas para o ano que vem: não deu nem indícios de que sabe como vai controlar o déficit. O tempo está ruim e não está com cara de melhorar.

    Terceiro, dado que não há plano visível e confiável de controle de gastos e que a presidente pretende aumentar investimentos "em obras" em 2014, o deficit vai aumentar. Há gente ponderada (nas previsões) e graúda falando em deficit de 4,5% do PIB em 2014.

    Chegamos perto disso no final de 2009, ano de recessão e rescaldo da crise de 2008, flutuamos em torno de 4% do PIB no início de 2006 e, antes disso, apenas tivemos números tão ruins em 2003, quando o país se recuperava de variados desastres econômicos.

    Para piorar, 2014 não será fácil. Vai começar com tumultos orçamentários americanos. Antes do meio do ano, haverá tumultos devido à mudança de política monetária dos EUA (menos dinheiro jorrando, juros mais altos lá e cá, com dólar subindo). Haverá a incerteza derivada da eleição para presidente.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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