• Colunistas

    Thursday, 02-May-2024 11:49:29 -03
    Vinicius Torres Freire

    Morte matada e vida na eleição

    11/04/2014 03h00

    A ONU publicou o relatório que, entra ano, sai ano, atesta nossa selvageria, ignorância, iniquidade e incompetência, o Relatório Global sobre Homicídios.

    De acordo com o estudo das Nações Unidas, o Brasil está no segundo grupo de países mais violentos do mundo. A gente pode enterrar a cabeça na areia dos cemitérios e se congratular ilusoriamente com o fato de que perdemos o campeonato mundial da morte.

    Se a gente tira da lista aqueles pobres micropaíses da América Central, o Brasil está na briga pela medalha de prata ou pelo menos de bronze da Olimpíada dos assassinatos, com uma taxa de 25,2 homicídios por 100 mil habitantes. Não temos como competir com a desordem da Venezuela, com taxa de 53,7. Os números referem-se ao ano de 2012.

    Estamos à frente do México, que nem era um país assim recordista antes das guerras e guerrilhas dos cartéis da droga, antes de 2008. Estamos na cola da África do Sul, de favelas e história de apartheid, da Colômbia, que apenas agora consegue retomar o controle de seu território das narcoguerrilhas, e da República Democrática do Congo, onde praticamente não há Estado.

    A taxa do Chile é um oitavo da brasileira. As de Argentina e Estados Unidos, mais ou menos um quinto. A situação brasileira é ainda pior que a expressa pela taxa média de homicídios, que apenas não é maior nem tem aumentado devido à grande redução do morticínio em São Paulo desde 2000 (a taxa paulista é de 10 homicídios por 100 mil, ainda alta, no entanto).

    O Rio, que contribuiu um tanto também para atenuar a perversão brasileira, está na média nacional. A taxa de Minas é 80% maior que a paulista, a de Pernambuco, mais que o triplo, a da Bahia, quase o quádruplo, para ficar nos Estados maiores.

    Se a oposição está à procura de um tema sério e muito popular, este será sempre um prato cheio de balas.

    Violência é um assunto tão sério quanto política econômica, saúde e escola. Apresenta uma grande vantagem eleitoreira em relação à economia: ao contar a verdade, o candidato corre muito menos risco de perder votos. Difícil é apresentar um programa eficaz, inteligível e sem demagogias e burrices; de resto, é apenas indiretamente um assunto federal.

    Segurança depende de progressos civilizatórios que ocorrem apenas a médio e longo prazos. No curto prazo, depende de polícia inteligente, desarmamento, ruptura do crime organizado, uma atenção especial a adolescentes masculinos, um plano para lidar com drogas, com fronteiras e com a inépcia da política judiciária e da Justiça criminal. Tudo muito óbvio, coisa que qualquer cidadão leitor de jornais sabe.

    Menos óbvia é a capacidade de um candidato evitar conversinhas a respeito desses temas. O que vai propor a respeito da posse de armas? Do uso e tráfico de drogas? O que vai fazer das fronteiras? Vai mandar também as Forças Armadas em massa e bem equipadas para lá? Como ajudar os Estados a melhorar as polícias civis, purgando corruptos e transformando policiais em técnicos? O que o candidato conversou com o Judiciário a respeito da melhoria dos processos e das cadeias sórdidas?

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024