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    Vinicius Torres Freire

    Economia pelo método confuso

    02/07/2014 02h00

    Os juros "básicos" do mercado caem desde meados de maio. Trata-se da taxa de juros que determina aquelas cobradas dos clientes dos bancos, a taxa real (taxas negociadas no mercado futuro descontada a inflação esperada).

    É fácil ver os motivos pelos quais a taxa de real de juros no mercado tem caído. Difícil é entender como a inflação tende a cair de modo relevante, a não ser que se espere uma piora horrível da economia.

    O que houve em maio? O que puxou os juros "básicos" da praça do mercado para baixo?

    1) O Banco Central deixou quase evidente que não aumentaria a "sua" taxa básica de juros (aumentou no início de abril, de 10,25% para
    11%, encerrou a campanha no final de maio);

    2) Pareceu que voltara a calmaria no mercado financeiro internacional, que passara por tumulto no primeiro bimestre (juros se acalmaram nos Estados Unidos, o dólar ficou calmo por aqui, passou a entrar dinheiro no país);

    3) Confirmou-se que a economia brasileira tendia à estagnação. A confiança de empresários e consumidores, que era pouca, definhou. A indústria deu sinais de que 2014 será outro ano perdido. O nível de emprego e da massa de rendimentos parou de crescer, ao menos nas grandes metrópoles. O crédito que não é regulado pelo governo parou de crescer.

    A baixa da taxa real de juros no mercado não implica, necessária e imediatamente, um relaxamento monetário (crédito e juros), mas certamente não favorece um aperto. No entanto, ainda teremos inflação rodando a 6% até o final de 2015, para nem mencionar o fato de que, como certos preços estão represados, controlados pelo governo, a inflação real deve ser pelo menos de um ponto percentual maior.

    Preços represados e descrença de que a inflação vá cair de modo relevante são empecilhos à queda da inflação de fato. De resto, apesar de o BC ter elevado os "seus" juros de abril de 2013 a abril de 2014, a expectativa de inflação para 12 meses adiante é maior agora do que em abril de 2013.

    Além do mais, os bancos públicos jogam lenha na fogueira que o Banco Central quer apagar. Apenas o crédito regulado pelo governo cresce, parte dele oferecido a taxas reais de juro zero ou de "pai para filho" (ou seja, o Banco Central eleva as taxas de juros de um lado, a banca estatal baixa do outro. Não faz sentido).

    A cereja desse bolo, talvez melhor dizer melancia, é o gasto público, que não colabora no esforço de contenção da inflação. A poupança do governo caiu muito neste ano, como de resto tem ocorrido desde 2011.

    A maré, portanto, não parece favorável à baixa da inflação: juros de mercado em baixa, gasto público em alta, expectativa de inflação ainda alta até 2016, crédito exorbitante nos bancos públicos, governo ainda a estimular empresas, ora um contrassenso.

    Pode ser que o crescimento em torno de 1% tanto neste 2014 como em 2015, quase estagnação, seja capaz de baixar a inflação, sabe-se lá para qual nível, porém. Note-se, ainda assim, que tudo é feito pelo método confuso, com impulsos contraditórios, um estímulo aqui, uma freada ali, o que tende aumentar o custo e a duração dos consertos da economia.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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