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    Vinicius Torres Freire

    Economia diz pouco sobre eleição

    13/07/2014 02h00

    Não é lá simples descobrir qual o grau, a abrangência e o tipo de degradação econômicos capazes de provocar danos decisivos no prestígio de um candidato à reeleição para presidente.

    Ainda que o estrago seja extenso e afete as condições concretas da vida cotidiana, a opinião do grosso do eleitorado sobre o governante parece depender de algo mais: de memória, de confiança e do que inspiram as alternativas.

    FHC reelegeu-se em 1998 quando a economia se esfrangalhava em várias frentes. A situação macroeconômica era grave. Mas, até que sobrevenha um colapso concreto, avaliações assim abstratas não costumam fazer sentido para o eleitorado. No entanto, aspectos da "vida real" também pioravam.

    Em 1998,o PIB, não cresceu. Em se tratando apenas de um ano, tal fato não diz grande coisa sobre o cotidiano. A medida do PIB pode indicar uma economia em desequilíbrio e em degradação; no entanto, o consumo pode ser ainda crescente.

    Naquele ano de 1998, porém, o consumo das famílias decrescia: andava pior que o PIB. A taxa de desemprego subiria de 5,7% em 1997 para 7,6% em 1998.

    Em compensação, a inflação do ano seria de 1,6%. De 1994, ano da estabilização, a 1997, o país crescera em média 3,8% AO ANO. Não era brilhante, mas no TOTAL acumulado nos anos da hiperinflação, de 1988 a 1993, o crescimento não passara de 3,8%.

    Um ano de consumo ruim não parecia sob julgamento naquela eleição. Parecia haver crédito para um governo que dera cabo da insegurança quase absoluta da vida sob hiperinflação. Mesmo com a piora econômica palpável, as pesquisas do Datafolha da época indicavam relativa confiança no futuro.

    Tal patrimônio político, essa reserva de confiança, explodiria logo depois da eleição, com a desvalorização abrupta do real, mesmo antes de o efeito da crise se espalhar pelas ruas. A popularidade de FHC passaria a se arrastar para sempre.

    Entre os anos horríveis de 2002 e 2003, o país quebrado, sob megadesvalorização cambial, inflação de alimentos a 20% anuais e de desemprego de quase 12%, a confiança econômica da população no entanto se recuperava. Havia então confiança em Lula.

    O PIB de 2014 deve crescer 1% ou menos. Os estragos macroeconômicos são sérios, mas apenas agora começam a se tornar visíveis. Parecem ainda imateriais em um país de pleno emprego, um país no qual os que deixam de procurar trabalho muita vez o fazem devido a alguma folga na renda familiar.

    Um país de consumo ainda crescente; em que a inflação da comida baixou das alturas de 14% ao ano de 2013, embora os 6,5% da inflação média sejam um problema macroeconômico que ainda vai dar dor de cabeça.

    Trata-se do mesmo país, porém, em que a percepção de insegurança econômica é maior que a registrada no péssimo biênio 2002-03. De um país em que, num ano de economia algo melhor, 2013, o prestígio da presidente foi talhado pela metade, por onde anda até agora. Ainda assim, um país que quase reelege a presidente no primeiro turno, por ora.

    Não "é a economia, seu burro" (tradução melhor para o clichê americano "é a economia, estúpido"). Não só, indicam as histórias de FHC, Lula e Dilma.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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