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    Vinicius Torres Freire

    Crise do comércio é de ferro

    04/11/2014 02h00

    As vendas de produtos brasileiros para o exterior chegaram ao pico em março de 2012. Os negócios começaram a emperrar um pouco antes. Desde o fim de 2011, o valor das exportações não chegou a despencar, mas baixou mais de 8%.

    Não é simples assim dizer que tal e qual produto pesou mais no resultado, mas ferro, açúcar, petróleo e a indústria de bens de metal e mecânico são bons candidatos. Ou mesmo o café.

    A menção a minério de ferro, açúcar e café pode suscitar ideias equivocadas a respeito do "primitivismo" da lista de produtos que as empresas do país vendem lá fora. O fato de o superavit comercial, exportações menos importações, encaminhar-se para o zero pode dar ensejo a comentários mercantilistas. Antes de mais nada, pois, troque-se em miúdos o que se passa na balança comercial brasileira.

    Desde 2011, a exportação de minério de ferro caiu US$ 12 bilhões, se comparado ao resultado acumulado nos 12 meses até setembro (no conjunto, o valor das exportações caiu US$ 17,9 bilhões no mesmo período). O consumo chinês acelerado elevou os preços, que induziu o aumento da produção. Agora, a China anda mais devagar, e a oferta do produto aumentou.

    O açúcar apanha por motivos parecidos, de excesso de oferta, e preços baixos. As vendas de petróleo se recuperaram bem nos últimos 12 meses, mas tomaram um enorme tombo desde 2011. A produção foi ruim, o consumo foi alto e, como se sabe, a política para o setor tem sido uma barafunda horrível faz meia década.

    A indústria padece porque temos inflação desagradável (os custos de produção sobem) num mundo em deflação e em liquidação de produtos (sobras, dada a lerdeza econômica mundial).

    Além do mais, o câmbio este- ve desfavorável (dólar barato facilita importação, dificulta exportações) e a política econômica criou outras dificuldades para a produção brasileira.

    E daí? Um deficit comercial em si mesmo não é necessariamente ruim, embora seja impressionante a baixa do saldo comercial brasileiro: de 5% do PIB no início de 2006 para quase zero agora.

    Não dá para pensar no saldo comercial sem levar em conta o conjunto das transações correntes brasileiras com o exterior (que inclui também serviços), o "deficit externo". O Brasil tem deficit externo crescente desde 2008, saindo de zero para 3,7% do PIB.

    Em si mesmo, pode também não ser um problema. Depende da velocidade com que o rombo cresce e de como ele é financiado (é preciso que entrem dólares do exterior, por meio de investimentos ou empréstimos). Depende ainda da "qualidade" do deficit: dos motivos e das finalidades do nosso excesso de consumo no exterior.

    O Brasil, tanto governo como famílias, consumiu além da conta nos últimos anos. Com um deficit externo de tamanho razoável e num mundo com sobras de capital barato, foi mais simples financiar o deficit. Agora, vai complicar um pouco. Para piorar, não aproveitamos a bonança externa para aumentar o investimento em nova produção.

    E, então, de repente, a gente volta a pensar no preço do ferro e do açúcar, digamos metaforicamente. Mas nem tanto.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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