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    Vinicius Torres Freire

    Consequências econômicas da roubança

    19/11/2014 02h00

    A roubança na Petrobras aparece agora aos borbotões, em golfadas, uma fila de dominós em queda, para recorrer a imagem original. Presidentes e diretores das maiores empreiteiras do país passam a admitir o pagamento de propinas, contando o que pelo menos por ora parece ser uma história concertada de extorsão, no mínimo.

    O escândalo político mal começou, mas as consequências econômicas da bandalheira, algo mais intangível, já parecem evidentes, embora ainda seja difícil de estimar a extensão do estrago.

    De resto, o tamanho do prejuízo dependerá da reação do governo, do que planeja fazer não apenas da administração das estatais mas também de outras intervenções contraproducentes no mercado.

    Controles de preços, de taxas de retorno ("lucros") e alterações doidivanas de normas contribuíram para o descrédito da maior empresa do país, a Petrobras, de outras estatais e, em certa medida, dos mercados brasileiros em geral.

    O custo de fazer seguro financeiro contra calotes da Petrobras já subiu muito (medido por um contrato chamado Credit Default Swap, que grosso modo também mede o risco de fazer negócios com a empresa, além de, muita vez, servir de instrumento para grossa especulação).

    O preço das ações da petroleira se arrasta nos valores mínimos do ano. No entanto, não foi nem de longe a evidência da roubança que fez os papéis da empresa descerem a ladeira.

    Desde 2011, o preço das ações preferenciais da Petrobras caiu mais de 54%. Os da Eletrobras, uma estatal muito mais arrebentada, baixou quase 74%.

    Nesse período, o Ibovespa, o preço médio das ações mais importantes, caiu cerca de 25% (note-se que a Petrobras tem peso grande nesse índice). Neste ano, o Ibovespa sobe 1%. A Petrobras cai 27%. A Eletrobras, quase 30%.

    As estatais padecem dos efeitos das intervenções do governo, que se vale das empresas como instrumento de política econômica, política ruim para a economia e para as empresas, controlando preços, obrigando-as a fazer negócios com baixa taxa de retorno etc. A roubança é a cereja podre desse bolo. Talvez a melancia podre.

    O preço das ações, que muita vez pode ser apenas resultado de jogatinas temporárias, reflete o descrédito das empresas e pode contagiar o resto do mercado (o restante da Bolsa). Mas não apenas.

    O que será, por exemplo, das futuras concessões de serviços públicos e obras de infraestrutura, que pelo menos pareciam estar nos planos do governo? Qual a credibilidade das concorrências, dos sócios brasileiros?

    Qual será o risco percebido de entrar nesses e noutros negócios no Brasil (seja o risco, digamos, policial ou o risco regulatório, de intervenções governamentais)? Aliás, sem a receita de concessões e dadas as avarias nas estatais, o que será da receita do governo, que conta com esses dinheiros a fim de cobrir seu deficit crescente?

    Para recorrer a outra imagem original, é possível fazer uma limonada desse trem de limões podres. Mas o governo vai ter de virar do avesso o entendimento que tem do papel das estatais, além de fazer uma enorme limpa policial, administrativa e financeira nas empresas.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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