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    Vinicius Torres Freire

    A porta do inferno e o corredor do hospital

    05/12/2014 02h00

    O governo mandou nesta quinta-feira para o Congresso o plano genérico e revisado do que pretende fazer de suas contas e do que imagina ser o futuro da economia em 2015 e, quase ficção científica, em 2016 e 2017, a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias).

    Quase nenhuma novidade, apenas tristezas. Caso as previsões se confirmem, a economia do Brasil terá crescido 1,7% ao ano entre 2011 e 2017, do primeiro ao penúltimo ano de Dilma Rousseff –no pior quadriênio de FHC, a média foi de 2,1% ao ano.

    No ano que vem, o país ainda gastará 5,3% do PIB em pagamentos de juros da dívida pública, o equivalente hoje a uns R$ 266 bilhões, mais de dez vezes o gasto do Bolsa Família, para recorrer a uma unidade de conta popular. O gasto com juros já foi maior, mas viera em tendência de queda de 2003 a 2011. Tolerância com inflação e mais descrédito e gastos do governo, que implicam juros maiores, contribuíram para que fosse suspensa a baixa gradual da despesa com esse Bolsa Rico.

    A LDO para 2015 foi revisada ontem, um dia depois de o Congresso aprovar a anistia para o estouro das contas federais de 2014, um vexame votado em meio à avacalhação pública da gestão Dilma Rousseff, entre outras indignidades.

    Os novos ministros da economia já haviam adiantado a novidade principal da LDO, a nova meta de poupança do governo para 2015, o dito superavit primário (receita menos despesas, desconsiderados gastos com juros), que ficou em 1,2% do PIB.

    Mais ou menos metade disso terá de vir de aumento de impostos, ainda não se sabe bem quais: fim do desconto do IPI para bens duráveis, volta do imposto sobre combustíveis, talvez algum imposto sobre operações financeiras ou, mais ousado, sobre movimentação financeira (uma CPMF-mirim) etc.

    A estimativa para a taxa básica de juros média em 2015 sugere a crença de que o BC elevará a Selic de 11,75% para 12% em janeiro e para 12,25% em abril, ficando por aí até o fim do ano. Trata-se, de qualquer modo, da previsão da centena de economistas de instituições financeiras e consultorias ouvidas semanalmente pelo Banco Central.

    No caso de PIB, câmbio e juros, o governo passou a adotar essas estimativas do "mercado", em vez de dar seus próprios e exagerados chutes informados para o alto.

    As previsões para a dívida pública são do BC. Embora não seja culpa do BC, tais estimativas têm algo de fantasia, se por mais não fosse porque a nova equipe econômica deve descobrir dívidas esquecidas em algum armário, não contabilizadas de modo devido, o que se chamava de "esqueletos".

    Os esqueletos nem de longe devem ser grandes quanto os descobertos na segunda metade dos 1990. Mas haverá caveirinhas. Enfim, sabe-se lá qual será o tamanho da conta de juros, que depende da taxa de juros e de quanto vai custar o programa de controle do câmbio do BC (está saindo caro).

    Em entrevista recente ao jornal "Valor", o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, colunista desta Folha, disse que se deve "...acreditar que ela [Dilma Rousseff] olhou a porta do inferno e, como o Lula, resolveu mudar" a política econômica. Melhor dar as costas para o inferno. Mas na volta vai se caminhar pelo longo corredor do hospital.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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