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    Vinicius Torres Freire

    Um certo fim dos tempos petistas

    15/04/2015 02h00

    Os anos petistas foram de aumento espetacular do consumo e do emprego legal. No início deste quarto governo do PT, o consumo míngua, decresce em velocidade de colapso, e os direitos da "carteira assinada" estão sob risco de avacalhação com essa reforma disfarçada e destrambelhada das leis trabalhistas embutida na lei da terceirização. As leis são anacrônicas, mas não é assim que se faz.

    Desde que a economia se estabilizou, em meados do segundo ano do governo Lula 1 (2004), não se vira resultado tão horrível nas vendas do comércio quanto neste início de 2015. Os números de fevereiro, divulgados ontem, podem estar contaminados por particularidades temporárias –mês curto com Carnaval, de aumento brusco dos combustíveis e de população em choque pelo tarifaço e outras notícias de estelionato eleitoral. Mas a "tendência é clara", se pode dizer, como o juiz comentarista de TV.

    Nos doze meses contados até fevereiro, as vendas do varejo cresceram 0,9% (na conta que exclui o comércio de veículos e suas peças e material de construção, que foi ainda pior). Em 2014, o crescimento fora de 2,2%. No tumultuado 2013, de ainda de 4,3%. Na média dos anos dourados petistas, 2004-2012, de extravagantes 7,9%.

    Não se trata de dizer que o padrão de vida medido pelo consumo subitamente se desmilinguiu, obviamente, apesar da freada deste início de ano, brusca como não se via faz mais de uma década. Desde 2004, o consumo de varejo aumentou 87%, já descontado o aumento da população. Isto é, o consumo per capita, medido pelas vendas de varejo, cresceu quase o dobro do PIB, que avançou 47,3%. Logo, em certo sentido é um despropósito falar em regressão.

    Apenas em certo sentido. O consumo crescendo a ritmo menor parece ter contribuído para azedar os humores que apodreceriam de vez em junho de 2013. O ritmo de alta do consumo entrou em tendência de baixa no início de 2013, assim como a confiança econômica dera então uma balançada, em especial por causa do pico da inflação de alimentos.

    Depois de melhorada provisória, as vendas do varejo voltaram a desacelerar rapidamente na segunda metade de 2014 e, agora, mergulham para o zero em uma velocidade imprevista mesmo quando se leva em conta o avanço lento do crédito e da massa salarial ampliada (que leva também em conta rendimentos outros que não o do trabalho nas grandes metrópoles), embora o total dos salários nas grandes cidades também comece a encolher.

    Por falar nisso, em fevereiro diminuiu a quantidade de pessoas com emprego formal, o que não acontecia desde a virada de 1999-2000. Repita-se, outra vez, que não se regrediu à precarização. Convém lembrar que, no início dos anos FHC, um terço dos trabalhadores tinha emprego formal, grosso modo. Ao final dos anos Dilma 1, eram dois terços.

    O novo eleitorado, boa parte ainda criança nos tempos de crises crônicas, está chocado com a desmelhora, com a frustração de suas expectativas aumentadas, com a traição da promessa eleitoral de que a freada seria passageira e com a constatação de que a melhora de vida não depende apenas de consumo, mas de serviços públicos e de infraestrutura, que pouco avançaram, deixando a vida ainda mais difícil nas médias e grandes cidades.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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