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    Vinicius Torres Freire

    Dilma 3, a missão

    19/04/2015 02h01

    Suponha-se que Dilma Rousseff não evapore em um ataque atômico (impeachment) ou não se renda incondicionalmente (renúncia).

    A fim de evitar a derrota da morte lenta, conviria ter um plano de guerra e de reconstrução, pelo menos um projeto que vá além do mero rescaldo do desabamento das políticas econômicas de Dilma 1. Até o momento, a presidente apenas debanda, bate em retirada, negocia armistícios em condições subalternas ou não toma a ofensiva em assuntos essenciais.

    O que tem feito ou vai fazer?

    A ofensiva "progressista".

    O governo aproveitou uma deixa com seu protesto contra a mudança da maioridade penal, mas haverá mais saudações a bandeiras "progressistas". Dilma deve aparecer ao lado de movimentos de direitos humanos e "minorias". Deve conversar com centrais sindicais a fim de reconvertê-las ao governismo, não se sabe bem como, dado o arrocho.

    A ofensiva "contrapropaganda".

    O governo acredita que seu grande problema é de imagem, de imagem distorcida e que essa distorção consiste de ser pintado de corrupto ou conivente. Assim, vai se esforçar um tanto mais para propagandear a ideia de que este é um governo em que as instituições limpam o país.

    A ofensiva "pacificar o PMDB".

    O governo destituiu o PT de negociações políticas e distribuição de cargos e outras prebendas, agora dever e direito de Michel Temer. Dilma partiu o pão com Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e sabe-se lá mais o que ainda vai partilhar. Procura amaciar Renan Calheiros. Continuam discretamente as tratativas para dar uma mãozinha a parlamentares pendurados na Lava Jato.

    Ofensiva "Petrobras".

    A empresa vai apresentar balanço. Arrumou uns empréstimos exóticos para fechar o caixa neste ano. Desmonta à matroca e com cara de paisagem o projeto Dilma 1. No lugar de investir e se endividar em ritmo doidivanas, a estatal vai vender ativos e cortar investimentos. A política de conteúdo nacional morre sob o próprio peso. Na semana passada, um ministro chegou até a dizer que a Petrobras não seria mais parte obrigatória das sociedades de exploração do pré-sal, pilar do modelo Dilma 1 para o petróleo. Mesmo aos trancos e barrancos enlameados, a empresa despiora um tico.

    Ofensiva "acordão das emprei- teiras".

    O governo procura dar um jeito de evitar a recuperação judicial de mais empresas, de evitar que percam o direito de fazer negócios com o setor público, enfim, de dar um jeitinho nesse desastre que pode comprometer, entre outras coisas, o programa de concessões de infraestrutura.

    Isso tudo é pouco mesmo para um governo diminuído de poder. Para começar, conviria haver logo um plano econômico que vá bem além do "ajuste", o qual Dilma aceitou de modo passivo, à beira da ruína, sem abdicar de ideias equivocadas.

    Não se sabe se a presidente compreende o problema, se resiste à reforma por teimosia ou mesmo se tem condições de formulá-la. Talvez acredite que, "passado o ajuste", o Brasil "volta a crescer" e Dilma 2 até rasga a fantasia, voltando a ser Dilma 1. Tratar-se-ia de delírio, ilusão contraproducente até para os interesses da presidente. Sem projeto novo, está sob risco mesmo a convalescença arrastada da economia. É preciso aparecer uma Dilma 3.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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