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    Vinicius Torres Freire

    O novo calendário da crise

    14/05/2015 02h00

    Até o começo de junho, os economistas de Dilma 2 devem apagar a maior parte do incêndio tocado por Dilma 1, caso o Congresso não lance chamas nas ruínas.

    Concedido o relativo otimismo, fica a pergunta: Dilma 2 vai então formular algum projeto positivo de reforma? Vai começar a discutir o ajuste de 2016?

    Até junho vota-se o plano de corte de despesas e aumento de impostos de Joaquim Levy. O ministro da Fazenda promete que em até dez dias sai o Orçamento de verdade.

    No início de junho, o Banco Central deve fazer ou anunciar o último aumento da taxa básica de juros neste ano. Também no mês que vem, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, deve revelar o plano concessões de infraestrutura, aeroportos, rodovias, ferrovias e talvez alguma coisa em portos.

    Graças à recessão feia, ao aumento horrendo de preços e a alguma sorte com as chuvas, estima-se agora que não deve haver racionamento de eletricidade neste ano. Existe até a esperança de que se desmonte, ainda que de modo disfarçado e precário, o programa que arruinou a Petrobras.

    A própria enumeração dos focos de incêndio, porém, indica que a coisa ainda estará quente em 2016.

    O superavit primário federal prometido para 2016 é o dobro do anunciado para 2015. A economia deve crescer um tico, e haverá receita extra devida a leis aprovadas neste ano. Ainda assim, não vai ser fácil. Para começar, não conviria contar com outro talho no investimento público, que será de uns 30% neste ano, o equivalente talvez a um quarto do superavit federal deste 2015.

    O setor elétrico está em desordem endividada. Sim, usinas importantes passam a operar daqui até 2016. Mas a situação dos reservatórios ainda será crítica e, a não ser em caso de novo desastre econômico, o consumo de eletricidade volta a crescer. Ainda não se sabe de reforma do setor.

    Faltam crédito e meios de financiar setores essenciais para alguma retomada econômica, construção pesada, infraestrutura, construção civil, em parte devido à ruína corrupta das empreiteiras. Escasseia o dinheiro no BNDES, na poupança ou no FGTS, por exemplo, e ainda não está claro como será a transição para um sistema de financiamento mais dependente do setor privado.

    Fica-se a pensar se é possível ressuscitar o investimento público sem alta adicional de impostos (ou corte de algum gasto público grande, o que em geral depende de leis complicadas de aprovar).

    Decerto os economistas de Dilma 2 estavam e ainda estarão por alguma tempo envolvidos na tarefa de lidar com a agonia de Dilma 1 e o decorrente risco de desastre. Porém, ainda que o paciente fique estável, o estado da economia é crítico ou pelo menos preocupante.

    Pode ser que o sucesso do arrocho, a recessão e a relativa calmaria no exterior permitam um corte na taxa de juros a partir do início de 2016. Mas o ânimo ou a capacidade dos bancos de conceder crédito devem estar avariados pela crise, falências e desemprego. O mercado de capitais está na apatia sabida; falta criar ou azeitar instrumentos para financiar a retomada de investimentos.

    Ainda restam muita fumaça tóxica e brasa dormida do incêndio de Dilma 1. O rescaldo vai demorar. Começa logo no mês que vem.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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