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    Vinicius Torres Freire

    Mandioca, o dia seguinte

    25/06/2015 02h00

    O arrocho dos juros ainda não foi o bastante; continua por mais algum tempo, confirmou ontem o Banco Central. O arrocho fiscal não seria o bastante, mas será ainda menos, pois a receita do governo cai, devido à recessão, e não aumentará o bastante, por decisão do Congresso.

    Ainda que a mudança de rumos de Fazenda e BC estanque o pior da sangria de Dilma 1, o problema material de base continua o mesmo: a dívida pública vai crescer ainda além da conta inicial dos economistas de Dilma 2.

    Isto posto, mais cedo do que o previsto será preciso discutir: 1) De onde o governo vai tirar o aumento extra e necessário de receita: mais impostos, privatizações, concessões, leilões, mágicas, milagres?

    2) Que medidas de reforma ou planejamentos de longo prazo o governo vai adotar a fim de atenuar a impressão de que vamos naufragar? Isto é, de passar a mensagem de que, embora quebrados no curto prazo, no médio prazo teremos condições de produzir e pagar as contas, pois terão havido reformas relevantes.

    Seria apenas difícil, mas não a ponto de desanimar, se a política não estivesse à deriva na barca dos loucos.

    Poucas horas depois de o Banco Central praticamente decretar um arrocho adicional, com o decorrente aumento das despesas com juros no médio prazo, a Câmara decidiu explodir a segunda bomba do ano nas contas da Previdência, estendendo a regra de reajustes reais e vinculados ao aumento do salário mínimo a todos os benefícios (antes restrita a benefícios equivalentes ao mínimo).

    Não haverá reajuste real do salário mínimo até 2018, pelo menos, graças à recessão. É bem provável que a presidente vete esse desvario, espera-se, assim como se espera que seja apenas alarmismo a impressão de que a presidente perdeu o resto do juízo, devida ao histórico discurso da mandioca.

    A decisão doidivanas da Câmara, porém, vai ser antecipada, "precificada" e trazida a valor presente. Vai custar caro agora.

    A lição a tirar é clara: 1) Não há liderança responsável pelo interesse público no Congresso, ao contrário. Há maltas incontroláveis de depredadores; 2) O governo, detestado por dois terços da população, sem programa e desmoralizado continua a ser politicamente avacalhado.

    Novidade nenhuma. Esse é o problema. Parece que se regride ao tumulto do primeiro trimestre. Ou seja, não há perspectiva segura de controle das contas do governo, o poder restante do governo foi confiscado, os escândalos de corrupção degradam ainda mais a atividade econômica, volta-se a discutir se há caminhos para o impeachment da presidente, graças ao caso das "pedaladas".

    A necessidade aguda de criar um programa para acomodar e atenuar o plano inevitável de arrocho econômico repõe, de resto, o problema essencial que é Dilma Rousseff. A presidente parece ainda se agarrar à fantasia do governo "2+2": dois anos de dureza, dois de recuperação. Parece não compreender o tamanho da encrenca, a necessidade de um programa amplo de mudanças. A presidente, enfim, precisaria renunciar a si mesma, ao sistema de ideias que provocou a maior pane econômica em um quarto de século, em um país que, embora medíocre, estava ao menos relativamente arrumado.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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