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    Vinicius Torres Freire

    Lula fortão, Lula fraquinho e a crise

    06/03/2016 02h00

    Lula no papel de vítima é uma personagem que mais preocupa do que anima a oposição, o PSDB pelo menos; prejudica o plano de deposição de Dilma Rousseff. Lula na delegacia e o tumulto decorrente vão fazer o PMDB deixar como está para ver como é que fica até os protestos contra a presidente, no dia 13. Vai à breca a discussão parlamentar de planos para conter a ruína econômica, que assim mais ruína será.

    Essas parecem ser algumas consequências do transe da semana passada e de Lula ter sido levado, sob vara, a uma delegacia.

    Lula vítima das elites, o "Lula fraquinho", a seguir pode se tornar o "Lula fortão", o pobre que venceu na vida, vingador do povo. Relembra-se aqui uma mistura de teoria com roteiro de cinema inventada lá por 2006 por João Santana. "Fortão" e "fraquinho" eram os papéis subliminares desempenhados pelo ex-presidente em campanhas e discursos orientados pelo marqueteiro.

    O Lula "fraquinho" que, tal como o Hulk dos quadrinhos, se torna "fortão", assusta oposicionistas. Mais que isso, embates contra Lula tiram o foco da derrubada de Dilma, na análise de senadores tucanos.

    "Bater em Lula é desperdiçar energia. Não resolve o problema do país. Lula não está no poder, é um problema da Justiça. Dilma é o foco", diz um líder tucano. Pior ainda, os ataques a Lula podem reaproximá-lo da presidente e reunificar o "campo petista" ou da esquerda. Movimentos sociais, partes do PT e o governo vinham se insultando.

    Na sexta-feira de noite, movimentos sociais que andavam chamando Dilma Rousseff de "traidora" da esquerda juntaram-se para saudar Lula e "barrar o golpe", no comício de desagravo no Sindicato dos Bancários de São Paulo.

    A "condução coercitiva" levou Lula a relançar sua candidatura para 2018 e prometer uma "caravana" pelo país. O PT prepara protestos para esta semana e para 31 de março, data do golpe que derrubou João Goulart. A princípio, essa manifestação deve se chamar "1964 Nunca Mais".

    O PMDB fica quieto, por ora. Antes de tomar um rumo, até o do impeachment, a ideia é: 1) Continuar o programa de pacificação até a convenção do partido, no dia 12: passar uma cola na relação entre Renan Calheiros e Michel Temer; 2) Esperar o que "será das ruas": avaliar a força de Lula e, principalmente, o tamanho do protesto do dia 13 contra Dilma.

    Segundo o pessoal do PSDB, praticamente foi por água abaixo a ideia de "colaborar" com programas de reformas ou remendos econômicos do governo. O plano é atravancar tramitações e insistir em destravar o processo de impeachment. Eduardo Cunha vai pelo mesmo caminho, emperrando a Câmara enquanto o Supremo não der definições sobre o rito de impeachment.

    Um trio de empresários e banqueiros relevantes ficou incomodado com o cerco a Lula, uma "irresponsabilidade, vai insuflar os ânimos e aumentar o conflito no país arrasado, como se já não bastasse a Dilma", no dizer de um deles, de resto nem favorável ao impeachment. O resumo da ópera dessa visão é que os processos "precisam ser resolvidos", com o mínimo de conflito, rapidamente, para que o país possa tomar um rumo, o que de qualquer modo julgam improvável –a crise ainda iria longe. Mas conflito na rua preocupa muito essas pessoas.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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