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    Vinicius Torres Freire

    Além de Dilma, outras guerras

    24/03/2016 02h00

    Os deputados votaram pelo aumento do gasto obrigatório do governo em saúde. Por 402 votos a 1, aprovaram ontem emenda à Constituição. Para valer, falta outra votação na Câmara e outras duas no Senado.

    Pois bem.

    No programa de governo de Michel Temer, está escrito: "...É necessário... acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação...".

    Está no documento "Uma Ponte para o Futuro", plano de reformas liberais patrocinado e lançado por Temer em outubro, quando o vice começou sua campanha para a Presidência, por assim dizer.

    E daí?

    Suponha-se que Temer assuma a administração da massa arruinada que Dilma deixará, caso deposta. Terá de lidar também com essa Câmara em que quase 80% dos deputados elevam despesas de um governo à beira da pindaíba terminal.

    No curto prazo, Temer não terá como dar jeito na pindaíba –reduzir o deficit. A receita ainda estará baixando; a oposição fez campanha aguerrida contra o aumento de impostos. Trata-se, aliás, de uma das reivindicações principais da "base social", política e empresarial do movimento de deposição de Dilma Rousseff: menos impostos.

    O deficit constante, o aumento descontrolado da dívida do governo, é um dos fatores principais desta crise. Mas não haverá tão cedo meios de controlar deficit ou dívida. Pode haver, porém, uma "ponte para o futuro". Firmar um compromisso legal de que os gastos cairão pode desfazer a expectativa de que o governo quebrará ou haverá enorme inflação.

    É o argumento da oposição. Que vai além: um superavit menor nas contas do governo, nos primeiros anos, pode ser compensado por um plano adicional de mudanças, que restaure a confiança e o retorno das empresas.

    Durante FHC 1, o superavit fiscal médio foi de menos de 0,3% do PIB, quase nada. Mas, segue o argumento, a expectativa de estabilidade, do fim da inflação, de privatizações e outras oportunidades para a empresa privada, enfim, de "reformas liberais" sustentou a confiança de que a coisa daria certo.

    Agora, boa parte dessas reformas que faça a "ponte para o futuro" vai implicar mais conflito político, econômico e social, ainda mais neste ambiente envenenado. Caso derrotados, com Dilma Rousseff, os movimentos sociais estarão ainda mais dispostos ao combate.

    De que reformas se trata?

    Mudanças que impliquem reduções de custos impostos pelo Estado e que elevem a expectativa de rentabilidade (menos burocracia, impostos menos dementes, infraestrutura melhor). Simplificação tributária, relaxamento das leis trabalhistas, concessões e privatizações com mais vantagens para as empresas (dado o ambiente de juro alto, incerteza e confiança deteriorada), menos inflação, custos salariais menores.

    Afora isso, como se sabe, estão nos planos a contenção de salários do funcionalismo e de reajustes das aposentadorias, entre outras reformas do INSS.

    Ou seja, a fim de conter a crise, o próximo governo precisa firmar um compromisso drástico com um calendário de mudanças que nem de longe estão na cabeça do Congresso e que enfrentarão forte resistência nas "ruas da esquerda".

    O dia depois de amanhã vai ser bem difícil.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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