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    Vinicius Torres Freire

    Sem imposto, não vai dar

    20/05/2016 02h00

    Dá pra entender um tanto do pânico dos economistas que acabam de chegar ao governo. A arrecadação continua a diminuir em ritmo cada vez mais rápido, mês a mês, soube-se nesta quinta (19), pela Receita.

    Ainda assim, parecem espantosas as novas previsões de deficit das contas federais para este ano, que sobem a cada dia de Michel Temer. Começaram na casa de R$ 120 bilhões. Nesta quinta, estavam "perto de R$ 180 bilhões", segundo o pessoal do governo.

    Isso é um deficit 90% maior que o previsto pelo governo de Dilma Rousseff. Equivale a um deficit primário de uns 2,9% do PIB. Se a revisão se confirmar, seria um repeteco de Grécia 2010 em termos de imprevisão do descalabro.

    De mais preciso sabe-se que a receita caiu 7,4% em termos anuais, nos 12 meses até abril. Em janeiro, baixava ao ritmo de 5,8%. Em um ano, evaporaram cerca de R$ 102 bilhões. Todas as contas estão em termos reais: descontada a inflação.

    No chute informado do governo dos últimos dias de Dilma e de muito economista do setor privado, a receita cairia de 3% a 5% ao fim deste ano. Otimismo.

    Com R$ 102 bilhões dá para pagar mais de três anos e meio de Bolsa Família. É dinheiro bastante para cobrir um ano de deficit da Previdência dos trabalhadores do setor privado.

    Ressalte-se que a receita líquida do governo federal não anda no mesmo ritmo da arrecadação: entram mais alguns dinheiros, saem outros. Mas o andar geral da carruagem é na direção do precipício.

    A receita cai cada vez mais rápido mesmo com as tentativas de elevar a arrecadação, medidas baixadas no ano passado. Algumas desonerações (reduções) de impostos não estão funcionando.

    Tanto faz a alíquota, as empresas não faturam ou, em muitos casos, preferem adiar o acerto de contas com a Receita. Não pagar imposto é muitíssimo mais barato do que pegar dinheiro emprestado no banco para fechar as contas.

    Trata-se de alerta para quem imagina que será possível cobrir rombos com o fim das desonerações –algum se pode arrecadar, mas não grande coisa. Por vezes, simplesmente não há faturamento para pagar tributo.

    Outros devaneios, passados e presentes, como fazer dinheiro com a Cide, se frustraram. O "imposto da gasolina" rendeu até agora, neste ano, R$ 1,9 bilhão –extrapolando, não dá R$ 6 bilhões por ano. No ano passado, esperava-se fazer uns R$ 12 bilhões anuais com esse tributo. Mesmo que a cobrança fique mais pesada neste ano ou no próximo, a receita faria apenas coceira no deficit monstruoso.

    Até março, o deficit anual do governo federal estava em 2,3% do PIB. Mas aí está embutida a despesa extraordinária do pagamento das pedaladas, que o governo foi obrigado a fazer em dezembro.

    Sem isso, o deficit estaria em 1,3% do PIB. Como o deficit chegaria a 2,9% do PIB, mais quase R$ 96 bilhões, até o final do ano, como vai chutando o governo Temer?

    Afora a necessidade óbvia de enfim acertar e explicitar as contas depois da bagunça Dilma Rousseff, o número importa para se saber do futuro. Quer dizer, o quanto é possível esperar de deficit "normal", recorrente, sem esqueletos no armário. De qualquer modo, parece quase impossível atravessar esse desastre fiscal sem um aumento brabo de impostos.

    vinicius.torres@grupofolha.com.br

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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