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    Vinicius Torres Freire

    Quanto vale o presentinho de Temer

    23/12/2016 02h00

    Joel Rodrigues/FramePhoto/Folhapress
    (e/d) Michel Temer, Henrique Meirelles e Dyogo Oliveira durante assinatura da MP do plano de proteção ao emprego, em Brasília (DF)
    O presidente Michel Temer e os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo Oliveira (Planejamento)

    Muito economista deve torcer o nariz para as lembrancinhas de Natal de Michel Temer.

    Mas é difícil dizer que o presentinho do FGTS, por exemplo, seja irrelevante, embora seja um presente do gênero "par de meias". Em termos econômicos, é um bandeide daqueles miudinhos, para cobrir agulhada de injeção.

    A mudança no rotativo do cartão pode aliviar um tantinho a vida dos endividados de morte (pagam em média juros de 475% ao ano). Mas o total de crédito no rotativo é de R$ 39 bilhões; o crédito total para pessoas físicas passa de R$ 1,5 trilhão.

    No entanto, banqueiros dizem que a pressão do governo sobre os spreads bancários deve fazer algum efeito (são eles que estão dizendo, atenção. Spread é a diferença entre o custo do dinheiro para os bancos e o custo cobrado dos clientes, tomadores de empréstimos).

    O custo de captação voltou ao que era em dezembro de 2014. Mas a taxa média para pessoas físicas passou desde então de 31% para os atuais 43%. Facada.

    Quanto vale o show do FGTS?

    O governo estima que possam ser sacados uns R$ 30 bilhões de contas inativas do FGTS. Equivalem a mais ou menos 1,5% da massa salarial, do valor total dos rendimentos do trabalho em um ano, conta feita com base nos dados do IBGE de agosto a outubro, os mais recentes.

    Um aumento de 1,5% da massa salarial parece pouco. Para comparar, quando se trata de massas de valores grandes assim, vale lembrar do crescimento médio da economia brasileira nas últimas duas décadas: 2,3% ao ano.

    É só um exemplo didático. Colocar esses R$ 30 bilhões do FGTS na rua não pode ser considerado medida de política econômica. É uma gambiarra, um remendo, um nozinho que pode se desfazer com qualquer marola extra nesta crise horrível. Mas, repita-se, não é irrelevante.

    Medir a relevância é que são elas. No entanto, a economia brasileira está catatônica. Não há impulso algum para colocá-la em movimento –consumo, investimento público, investimento privado, ganhos com exportações. O país tenta sair do chão puxando os cabelos.

    A queda dos juros e da inflação pode ser o primeiro impulso sério para dar fim a este horror de recessão. Enquanto o socorro sério não vem, pode ser que esses R$ 30 bilhões evitem miséria e desânimo maior. Lembre-se de que bastaram uns resultados piores em um bimestre da indústria para o país quase voltar a cair em depressão. Estamos pelo fio da navalha no pescoço.

    É de graça, é mágica? Quase certo que a arrecadação líquida do FGTS fique negativa em 2017, o que não acontecia desde 1999 (isto é, a receita será menor que os saques). É uma desgraça? Não, o fundo tem ativos de meio trilhão de reais. Mas a coisa vai ficar estressada.

    Note-se ainda que essa lembrancinha de Temer equivale a mais ou menos um terço dos investimentos anuais do FGTS, que em geral vão 80% para moradia popular e 8% para saneamento. Difícil dizer agora se essa verba vai diminuir. O setor de obras e construção civil está chiando.

    Enfim, a coisa não tem cara de que vai dar problema, se limitada a um ano. Sim, é medida do departamento de "mágicas & milagres", que não é do gosto da equipe econômica. Mas, "tudo mais constante", não é irrelevante.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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