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    Vinicius Torres Freire

    Morte a crédito no Brasil

    24/02/2017 02h00

    Alan Marques - 19.jul.16/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, BRASIL, 19.07.2016. O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, comanda a reunião do COPOM ( Comitê de Política Monetária), no Banco Central.(FOTO Alan Marques/ Folhapress) MERCADO
    O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn (dir.), comanda reunião do Copom

    AS FAMÍLIAS pagam suas dívidas. Mas o peso dos juros da dívida continua a crescer. O excesso de endividamento é um dos motivos principais da pestilência especial desta recessão.

    A peste financeira não está passando.

    Desde outubro, o Banco Central reduz a taxa básica de juros, primeiro a conta-gotas, depois, às colheradas. Mas a Selic baixa, enfim. Desde outubro, cai o custo do dinheiro para os bancos, o custo de tomar dinheiro a fim de reemprestar.

    Desde outubro, as taxas de juros dos empréstimos mais importantes para as famílias continuam a crescer, porém.

    É o que soubemos nesta quinta-feira (23), pelo balanço do mercado de crédito de janeiro, dados do BC.

    O custo do dinheiro para os bancos não depende apenas do custo de captação, claro. O custo mais importante e variável vem de calotes e atrasos. A inadimplência total caiu desde outubro, porém.

    Não é possível estimar custos de bancos a partir das contas agregadas (somadas, do total) publicadas pelo Banco Central. É verdade.

    Mas é verdade também que, em linhas gerais, os bancos estão na contramão do pequeno afrouxamento monetário promovido pelo Banco Central, decerto recente.

    Na contramão, atropelam a clientela, que morre a crédito. Em suma, o programa de governo e BC de atacar os problemas do crédito é para ontem.

    Pouco antes do começo da recessão, no início de 2014, o peso dos juros nos pagamentos das dívidas das famílias era de 40%. Em dezembro, estava em mais de 48%, subindo.

    Pelas contas do BC, as famílias gastavam 21,65% de sua renda total com pagamentos da dívida. Cerca de 10,5% da renda vão para a conta de juros.

    O peso dos juros no serviço da dívida (pagamento) das famílias em 2016 foi maior que em 2015, ano quase tão horrível quanto 2016. E daí?

    Caso se possam levar ao pé da letra, pelo menos ao pezinho, os números do Banco Central, contas indicam que esse peso extra de juros equivale a pelo menos R$ 21 bilhões.

    Parece pouco? Assim como parecem pouco os R$ 30 bilhões que os trabalhadores poderão sacar de suas contas inativas no FGTS, na estimativa oficial.

    Tudo somado, equivalem a 2,4% da "massa dos rendimentos do trabalho", grosso modo o total dos salários pagos em um ano, no caso o de 2016. Por exemplo, estima-se que o total dos salários cresça apenas 1% neste ano.

    Economistas preocupados com o longo prazo e reformas estruturais talvez torçam o nariz para o cálculo desses remendos. O problema é que estamos com água pelo nariz.

    A perspectiva otimista por enquanto é a de mera estagnação, de crescimento zero da renda (PIB) per capita neste ano. O risco de recaída ou permanência na recessão não é pequeno.

    Em nome de uma mínima pacificação social, econômica e política, não convém desprezar remendos racionais. Isto é, que não se recorra a mágicas e milagres.

    Na desgraça ainda estamos. As concessões de crédito (empréstimo de dinheiro novo) ainda caem ao ritmo de 10% ao ano (comparadas as concessões do trimestre encerrado em janeiro com o mesmo trimestre do ano passado).

    Há despiora. Mas lenta. No caso do crédito para pessoas físicas, o zero a zero está próximo. Para empresas, está péssimo.

    É preciso falar sobre juros. Já.

    vinicius torres freire

    Está na Folha desde 1991.
    Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

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