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    PF exige comprovação de renda para bolivianos entrarem no Brasil

    SILVIO CIOFFI
    ADRIANA FARIAS
    DE SÃO PAULO

    17/02/2014 03h15

    Saldo bancário de R$ 2.000, passagem de ida e volta e carta-convite de um responsável no Brasil são as exigências recentes que a PF tem feito aos bolivianos que aqui ingressam pela fronteira boliviano-brasileira em Corumbá (MS).

    Uma queda de braço entre autoridades policiais dos dois países nessa cidade contradiz, segundo especialistas, o acordo de circulação do Mercosul, tratado que tem o Brasil como membro efetivo e a Bolívia como país associado.

    A PF afirma, em nota, que adotou o procedimento baseada no princípio da reciprocidade desde que a imigração boliviana na fronteira com Corumbá passou a exigir de brasileiros "US$ 800, carta-convite ou reserva em hotel". A Embaixada da Bolívia em Brasília não se manifestou.

    Para Alberto do Amaral Jr., professor de direito internacional da USP, essa prática fere a Constituição e a declaração universal dos direitos humanos de "um povo pobre que foge do seu país em busca de melhores condições de vida."

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    O padre Roque Patussi, coordenador do Cami (Centro de Apoio ao Migrante) levou queixa à Secretaria de Direitos Humanos após receber ligações de bolivianos barrados.

    "Só deixaram a minha filha vir comigo depois que comprei a passagem de ida e volta dela", diz uma boliviana que não quis se identificar.

    O marido dela, boliviano, diz que muitos conterrâneos têm dormido dias na fronteira até serem admitidos.

    Suplente do tribunal do Mercosul entre 2004 e 2010, Nádia de Araújo afirma que a atuação da PF é legítima.

    "No fundo, a Polícia Federal está tentando evitar que esses bolivianos que vêm sem condições possam se tornar alvo fácil de quadrilhas que começam fábricas de roupa em condições sub-humanas, sem direitos trabalhistas."

    O Cami estima que ao menos 340.000 bolivianos vivam em São Paulo, embora o Censo de 2010 tenha registrado só 17.960 em situação legal.

    BARREIRA LEGAL

    Tirar documentos de permanência também é outro entrave, pois implica no desembolso de ao menos R$ 1.200.

    O Cami acredita que 70% dos bolivianos que aqui vivem tenham de 18 a 25 anos de idade. Em geral, eles sonham em juntar dinheiro no Brasil e, depois, retornar.

    "Consegui comprar um carrinho, mas um dia eu volto, tenho saudade do lago Titicaca", diz um boliviano que está aqui há 13 anos e largou a oficina de costura em que trabalhava com a família

    Ele diz que trabalhava 17 horas por dia, às vezes no escuro, e que recolhia restos dos pratos dos colegas para alimentar a filha pequena.

    De 2011 para cá, de acordo com a Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, 225 bolivianos foram encontrados em condições análogas à de escravidão.

    Na sexta-feira, um boliviano fugiu ao ser descoberto pela PM tentando vender dois compatriotas, por R$ 1.000 cada, numa feira do Brás. Procurado, até ontem, ele não havia sido encontrado.

    Marcio Neves/Folhapress
    Bolivianos na festa Alasitas ocorrida no Memorial da América Latina;
    Bolivianos na festa Alasitas ocorrida no Memorial da América Latina, em São Paulo

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