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    Rio de Janeiro

    Capitão de time do Brasil em Copa infantil é assassinado em Fortaleza

    FABIO BRISOLLA
    DO RIO

    27/03/2014 03h10

    O sonho de Rodrigo Kelton, 14, era jogar futebol num time profissional, se possível o Fortaleza, seu clube do coração.

    Ele era o capitão da seleção brasileira no Street Child World Cup, espécie de Copa do Mundo disputada por crianças de rua, criada por uma ONG inglesa.

    Rodrigo chegaria ao Rio amanhã, com o restante da equipe. Só que, às vésperas do início da competição (no próximo domingo), seu nome passou a ser associado à violência na periferia da capital do Ceará. Rodrigo foi executado com cinco tiros no último dia 14 de fevereiro.

    Morador de Genibaú, comunidade pobre de Fortaleza, ele caminhava na rua de sua casa quando recebeu dois tiros nas costas. O atirador chegou ao local de bicicleta. E, ao vê-lo ferido no chão, se aproximou para dar mais três tiros na cabeça.

    "Isso nos mostra como são constantes os assassinatos destes jovens, quase sempre invisíveis aos olhos da sociedade", disse Renato Rocha, 38, diretor artístico do Street Child World Cup.

    Em nota, a Polícia Civil do Ceará disse que está ouvindo testemunhas, mas não informou se já identificou suspeitos. Uma hipótese é que a morte tenha sido ordenada por traficantes locais em retaliação a furtos cometidos por Rodrigo no bairro.

    A família do garoto deixou às pressas Genibaú.

    "Ele vinha praticando furtos na comunidade. Foi apreendido pela polícia e passou 45 dias num centro para adolescentes infratores no ano passado", disse Antônio Carlos da Silva, 30, educador da Associação Beneficente O Pequeno Nazareno.

    Coube à ONG escolher os nove garotos do time brasileiro na competição, que reúne 19 países.

    "Rodrigo era o craque do time. Com o talento que tinha, poderia chegar ao futebol profissional", diz Silva.

    Ele conheceu Rodrigo num terminal rodoviário de Fortaleza, em 2009. Na tentativa de retirar das ruas o menino, na época com 9 anos, o educador acabou descobrindo o histórico de sua família.

    O pai era alcoólatra e a mãe, consumidora de crack. Separados, os dois vagavam por Fortaleza.

    Com a ausência dos pais, Rodrigo também passou a viver nas ruas com o irmão mais velho, que praticava roubos e furtos a pedestres.

    Nos encontros seguintes, o discurso de Silva surtiu efeito. Por dois anos, entre 2010 e 2012, Rodrigo permaneceu em um abrigo da Pequeno Nazareno em Maranguape, município da região metropolitana de Fortaleza.

    Saiu de lá no início do ano passado para voltar a morar em Genibaú com sua mãe, que havia iniciado tratamento para se livrar da dependência do crack.

    "Mas a mãe teve uma recaída, vendeu tudo o que tinha em casa para comprar droga e o Rodrigo voltou às ruas. Até que acabou detido sob acusação de furto", lembrou Silva.
    Ao deixar o centro de menores infratores, em outubro de 2013, o garoto procurou novamente a ONG. Retornou ao abrigo no mesmo período em que começava o treinamento para o torneio internacional de futebol.

    Silva contou aos garotos que a Copa das crianças de rua tinha o apoio do clube Barcelona, da Espanha, e de astros da bola, como o ex-jogador David Beckham.

    De acordo com o educador, Rodrigo estava empolgado e tinha a esperança de que sua participação pudesse chamar a atenção de algum olheiro europeu para, num golpe de sorte, mudar o rumo de sua história.

    Associação O Pequeno Nazareno/Divulgação
    Rodrigo Kelton, 14, foi morto com cinco tiros em Fortaleza
    Rodrigo Kelton, 14, foi morto com cinco tiros em Fortaleza

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