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    Rio de Janeiro

    OAB vai pedir afastamento de juiz barrado em blitz da Lei Seca no Rio

    DIANA BRITO
    DO RIO

    13/11/2014 16h31

    A OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro) vai pedir nesta sexta-feira (14) o afastamento imediato do magistrado João Carlos de Souza Corrêa, envolvido em polêmicas após processar a agente de trânsito Luciana Silva Tamburini. A petição será entregue às corregedorias do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do Tribunal de Justiça do Estado.

    "Vamos mandar a carta [petição] nesta sexta e vou pedir uma audiência na próxima segunda-feira (17) com o corregedor do tribunal para apresentar pessoalmente as denúncias", afirmou o presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz.

    Segundo Santa Cruz, a ordem pedirá o afastamento até que as denúncias sejam apuradas. Entre elas há uma em que o magistrado teria mandado fazer uma placa especial para o seu carro com os dizeres "Armação de Búzios - 01" - apesar de juízes de primeira instância não terem o direito a tal placa restrita. De acordo com o presidente da OAB-RJ, o objetivo do juiz era simular um carro oficial.

    A agente abordou o magistrado em 12 de fevereiro de 2011 durante uma Operação da Lei Seca no Leblon, zona sul do Rio. Na ocasião, Luciana verificou que o juiz não estava com sua carteira de habilitação e o veículo, sem placas e sem documentos. Assim, o carro do magistrado foi rebocado.

    Ao se identificar como juiz, Tamburini interpretou o gesto como uma tentativa de "carteirada", como se diz quando uma autoridade quer usar de sua influência para deixar de cumprir algo que é exigido dos demais. Em resposta, a agente disse que ele era "juiz, mas não Deus". O magistrado deu voz de prisão contra ela e o caso foi encaminhado para a 14ª Delegacia de Polícia, no Leblon. Tamburini se negou a ir à delegacia em veículo da Polícia Militar.

    Na quarta-feira (12), o Tribunal de Justiça do Rio manteve a condenação de Luciana por danos morais por ter dito ao magistrado que 'juiz não é Deus'. A decisão revoltou a agente: "Ainda estou chocada".afirmou.

    "Sinceramente ainda não estou acreditando. Como cidadã, digo que fiquei enojada. Acabaram de rasgar a Constituição", completou Tamburini.

    Os três desembargadores da 14ª Câmara Cível do TJ que votaram mantiveram, por unanimidade, a avaliação da primeira instância de que houve 'abuso de poder' por parte da agente. Houve entendimento de que ela ofendeu 'a função que ele [juiz] representa para a sociedade'.

    Ela havia sido condenada a pagar R$ 5.000 a João Corrêa, parado em blitz da Operação Lei Seca no Leblon (zona sul).

    Reprodução-5.nov.2014/Band
    A agente de trânsito Luciana Silva Tamburini
    A agente de trânsito Luciana Silva Tamburini

    *MAIS DENÚNCIAS

    João Corrêa também aparece citado em outra denúncia. Quando foi juiz da Comarca de Búzios, na região dos Lagos do Rio, o magistrado teria mandado todos os clientes de um restaurante saírem porque haveria uma "reunião sigilosa do Judiciário". Um cliente, porém, se negou a deixar o estabelecimento alegando ser filho de um desembargador –e só assim teria sido convidado a permanecer no local.

    Participaram da reunião na sede da OAB do Rio cerca de 50 conselheiros da entidade. Entre eles, o advogado Vanderley Rebelo, que defendeu a jornalista Beth Prata –que foi presa em Búzios após denunciar o juiz João Corrêa em suposto esquema com lideranças da prefeitura. Rebelo afirmou ter sido coagido pelo juiz na época.

    "Ele me ligou e disse quem é amigo da Beth é meu inimigo", lembrou Rebelo, que diz ter, inclusive, perdido clientes por pressão do juiz.

    A jornalista Beth Prata contou que passou a ser perseguida pelo juiz depois que fez uma denúncia contra ele à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio. Na ocasião, ela afirmou que o órgão arquivou as denúncias e as encaminhou ao juiz.

    "Ele mandou me prender por calúnia e difamação. Passei 12 horas presa. Depois, fui condenada por um juiz, amigo dele, a cinco anos de reclusão por um crime que a pena nem chega a 1 ano e meio, mas consegui provar minha inocência", disse a jornalista à Folha.

    A reportagem tentou contato com o juiz João Corrêa, mas ele disse por intermédio de um estagiário do Jecrim (Juizado Especial Criminal) do Fórum de Campo Grande, zona oeste do Rio, que "não vai se pronunciar sobre o caso".

    NOTA DA AMB

    Depois dos desdobramentos apontados na reunião da OAB do Rio, a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) emitiu nota repudiando a atitude do órgão dos advogados.

    O texto, assinado por João Ricardo Costa, presidente da AMB, "desaprova" as declarações do presidente da OAB e "condena o chamamento para a criação de uma campanha nacional para prejudicar a imagem da magistratura brasileira".

    "É lamentável que a OAB tente explorar uma conduta isolada, que compõe um processo ainda em andamento na Justiça, para promover o linchamento moral dos magistrados, atitude que em nada contribui para o aprimoramento do Judiciário Brasileiro" diz a nota.

    A entidade afirma que a postura mais contributiva seria a OAB associar-se aos magistrados para modernizar a legislação e limitar o número de recursos para garantir decisões mais céleres.

    "A associação reitera, por fim, a luta dos juízes brasileiros que atuam em cada comarca do país preservando os direitos e garantias aos cidadãos e na defesa do Estado Democrático de Direito, salientando que a conduta pessoal de cada cidadão não pode servir como parâmetro para julgamento de toda a magistratura brasileira", conclui o texto assinado por Costa.

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