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    Crise da água

    Racionamento em São Paulo completa um ano e amplia transtornos

    FABRÍCIO LOBEL
    FELIPE SOUZA
    NICOLAS IORY
    DE SÃO PAULO

    28/02/2015 02h00

    Ao longo de 2014, a designer Erika Neves, 29, que mora em Itaquera, na zona leste da capital paulista, se acostumou a uma nova rotina.

    Após acordar, ela lava o rosto e escova os dentes com água guardada na noite anterior em garrafas PET. Isso ocorre pois, de manhã, a água das tubulações não tem força para chegar às torneiras do banheiro.

    A causa do desabastecimento na casa de Erika tem nome: redução de pressão na rede de abastecimento, nas palavras do governo Geraldo Alckmin (PSDB). Na prática, porém, é um racionamento.

    Neste mês, a operação que reduz a força com que a água é enviada às casas completou um ano de transtornos aos moradores da Grande SP, em especial aqueles de bairros altos da periferia e distantes dos reservatórios da Sabesp.

    Justificada inicialmente como uma tentativa apenas de reduzir perdas nas tubulações, a operação se transformou na principal ferramenta do governo tucano para economizar água em meio à grave crise de abastecimento.

    Ao diminuir a pressão nos encanamentos, a Sabesp "empurra" menos água na rede. Por um lado, reduz os vazamentos. Por outro, deixa casas sem água, em especial as localizadas em pontos altos.

    E esse efeito colateral logo apareceu: sem aviso, diariamente milhares de pessoas começaram a ver suas torneiras secas durante horas.

    O governo estima que ao menos 200 mil pessoas vivam o problema do desabastecimento de maneira drástica. Os efeitos, porém, atingem um número incontável de pessoas de todas as regiões da cidade. Em maio de 2014, segundo o Datafolha, 35% dos paulistanos afirmaram ter tido o fornecimento de água interrompido no mês anterior. Em fevereiro de 2015, foram 71%.

    A manobra faz com que a Sabesp economize 8.000 litros de água por segundo. O bônus na conta de quem economizar, por exemplo, gera economia de 5.000 litros por segundo. Por isso, o feito foi visto pela empresa como uma "economia fabulosa" de água.

    O presidente da Sabesp, Jerson Kelman, ao assumir o cargo, informou que a operação iria ser intensificada ao longo de 2015, trazendo um inevitável "sofrimento" à população.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Para Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), durante muito tempo a operação era uma medida secreta.

    Segundo ele, ela só se tornou pública após as reclamações da população.

    "Como você espera colaboração da sociedade se você não é transparente e se não existe uma relação de confiança no que é dito pelo governo?", indaga Oliveira.

    Nesta semana, a Sabesp admitiu que reduz a pressão num nível fora do recomendado por normas técnicas.

    Questionado sobre o descumprimento, o presidente da Sabesp disse que, em situações em que o direito coletivo está ameaçado, normas devem ser "relativizadas".

    Esse descumprimento, que resulta em torneiras secas por toda a cidade, foi classificado pelo governador Geraldo Alckmin de "razoável".

    Para o tucano, o "problema" é agravado pelas famílias que não têm caixa-d'água em casa. Mas, das 25 mil caixas prometidas pelo governo no ano passado para famílias de baixa renda, apenas 700 foram entregues até agora.

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