• Cotidiano

    Friday, 17-May-2024 10:46:02 -03

    Dobra número de haitianos que chegam a SP em busca de emprego

    EMILIO SANT'ANNA
    DE SÃO PAULO

    11/03/2015 02h00

    De repente uma comemoração estoura no salão cheio de colchonetes e malas pelo chão. A notícia de que na terça (10) um grupo de 60 haitianos receberia a carteira de trabalho, que alguns esperavam havia quase 45 dias, é a responsável por romper o ritmo quase sonolento no local.

    É o primeiro passo para buscarem uma vaga de trabalho e deixarem para trás a Missão Paz –entidade ligada à Pastoral do Migrante–, onde desde janeiro o fluxo diário de haitianos mais do que dobrou.

    Ali, no Glicério, região central de São Paulo, até o final de janeiro dormiam cerca de 50 haitianos por noite. Hoje, esse número oscila entre 110 e 120, chegando algumas vezes quase a 150. E eles não param de chegar. São ao menos 30 novos "hóspedes" diários.

    Passam os dias no pátio da igreja Nossa Senhora da Paz, onde funciona a entidade, à espera das terças e quintas-feiras, dias reservados para o encontro com empresários em busca de mão de obra.

    Tudo o que os diretores da entidade esperam agora é que a emissão da carteira de trabalho seja flexibilizada –em um futuro convênio com a prefeitura, por exemplo- para que possam "desafogar" os salões da Missão Paz.

    Os 60 que receberiam os documentos na terça fazem parte de um grupo de 240 haitianos que serão atendidos nesta semana em mutirão do Ministério do Trabalho –resultado da ação do padre Paolo Parisi, coordenador da missão.

    Avener Prado/Folhapress
    Imigrantes haitianos em pátio da igreja N. Sra. da Paz, no Glicério (centro de SP)
    Imigrantes haitianos em pátio da igreja N. Sra. da Paz, no Glicério (centro de SP)

    Ao menos um ônibus com os imigrantes chega diariamente à São Paulo vindo de Rio Branco (AC). Muitos desembarcam por aqui. Outros tantos seguem até Porto Alegre (RS). O objetivo é um só: emprego. O aumento repentino no fluxo, estável desde o final do ano passado, se deve a alguns fatores. Um deles é a cheia no rio Acre, a maior de sua história, que além de obrigar 10,6 mil pessoas a buscarem alojamento nos 31 abrigos montados pelo Estado, fez com que os haitianos encurtassem a passagem por lá.

    Além disso, o fluxo dessa população em direção ao Acre também aumentou, diz o ex-secretário de Desenvolvimento Social do Acre, Antônio Torres –atualmente na pasta de Direitos Humanos.

    "Hoje estamos com 900 haitianos no abrigo", diz Torres, que explica que o local na capital acriana comporta cerca de 400. "O fluxo nunca caiu por aqui, e agora aumentou ainda mais."

    Em 2014, o aumento inesperado de imigrantes enviados à São Paulo gerou troca de farpas entre o governo do Acre e o governo paulista.

    Neste ano, a Secretaria da Justiça do Estado de SP pretende retomar o contato com o governo acriano para que a migração seja racionalizada.

    "Estou horrorizado, não é possível que sejam despejados dessa forma por aqui, são seres humanos", diz o secretário, Aloísio de Toledo César.

    CONTRATAÇÕES

    Na Missão Paz não só o número maior de "hóspedes" preocupa, mas também a iminente queda no número de empresas dispostas a empregá-los. Ainda que as contratações não tenham apresentado diminuição sensível, o número de empregadores que procuram o local caiu em fevereiro –de 60 para 33.

    J.P., 23, que pede para não ser identificado, é um dos que esperam por um trabalho. No Brasil há cerca de um mês, diz ter ouvido que pode ganhar até R$ 2.000 como pedreiro.

    No último mês, 166 imigrantes conseguiram a carteira assinada, número dentro da média, mas bem abaixo do recorde de maio de 2014: 498.

    O perfil dos empregos também mudou. "Antes a enorme maioria ia para a construção civil", diz o padre Paolo. "Agora, a maior parte vai para o setor de serviços."

    Ali Nassif, 58, dono de uma empresa de tapeçaria no Ipiranga, está em busca de "pelo menos dois". "Você não acha mão de obra brasileira."

    "Viemos buscar oito", diz Mariza Fernandes, consultora de uma empresa de jeans em Colatina (ES) que já emprega quatro haitianos. Ela afirma pagar R$ 1.000, com moradia e alimentação.

    Enquanto isso, Paolo reza para ouvir as comemorações dos haitianos mais vezes.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024