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    Ilha da Indonésia tornou-se paraíso da corrupção, dizem turistas e moradores

    DOS ENVIADOS À INDONÉSIA

    05/04/2015 02h00

    Entender Bali, como bem disse a jornalista Kathryn Bonella, exige perseverança. A ilha vai se revelando aos poucos, nas conversas ao pé do ouvido. Drogas, prostituição, máfias que dominam a noite, promiscuidade entre polícia e traficantes, borbulha ali um caldeirão. A pergunta pululava: como é o mercado de drogas num lugar regido pela pena de morte?

    "Com a chegada do dinheiro, a coisa está se sofisticando. E o mercado de drogas também. Onde há festas, há drogas", diz um australiano de 58 anos, radicado em Bali há duas décadas, que pediu para não ser identificado. Poucos em Bali falam abertamente sobre drogas.

    Segundo ele, o encontro da vocação hedonista com o dinheiro e a legislação rígida estabeleceu o cenário perfeito para a única lei vigente: a corrupção. "Você pode conseguir qualquer coisa, desde que esteja disposto a girar a roleta", afirma.

    A Embaixada da Indonésia no Brasil não retornou os e-mails e as ligações da Folha para se manifestar.

    IBIZA DO ORIENTE

    Além do circuito de praias célebres, como Uluwatu e Padang-Padang, os bairros mais famosos, por onde os turistas circulam, são Kuta, Legian, Séminyak e Canggu.

    Segundo o gerente de marketing do "La Favela", no coração de Séminyak, o francês Djenai Anouar, seu patrão, o espanhol Gonzalo Assiego, foi um dos pioneiros da transformação em curso de Bali na Ibiza do Oriente, a Meca das raves na Europa.

    "Abrimos o primeiro empreendimento em 2000, o La Plancha. Ficamos na lista dos cinco melhores bares do mundo por dois anos", comenta. "Quando você ama Bali, Bali ama você. Mas a ilha tem seus códigos."

    Os estrangeiros radicados em Bali (cerca de 4.000 pessoas) são chamados de expatriados –ou "expats". Difícil encontrar entre eles alguém disposto a falar do que se passa ali, atrás das baladas intermináveis e dos sorrisos dos balineses, um povo gentil, que de manhã e no fim do dia se amontoa nos templos, com oferendas e cantos.

    Com a garantia de ter a identidade preservada, os "expats" dizem mais ou menos a mesma coisa. Ser preso consumindo ou traficando drogas tem preço. O valor diminui ou aumenta dependendo da quantidade e da sagacidade para negociar.

    A roleta começa a girar em torno de R$ 32 mil. Ser pego em casa ou no hotel custa bem mais barato do que ser preso no aeroporto. Se o caso vai parar nos jornais, como foi o caso do brasileiro Marco Archer, pego com 13 quilos de cocaína no aeroporto de Jacarta, a capital da Indonésia, negociar torna-se bem mais difícil.

    "Eles te levam para um lugar neutro e começam a negociar. Tem que ser rápido para levantar o dinheiro ou te arrastam para uma delegacia", diz um surfista brasileiro que vive em Bali desde o fim dos anos 1980.

    O fotógrafo e cineasta Marcos Prado, produtor de "Tropa de Elite", frequenta Bali desde os anos 1990. Ainda na adolescência conheceu Marco Archer.

    Prado acompanhou os últimos anos do brasileiro no corredor da morte e estava em Bali para finalizar um documentário sobre o traficante fuzilado. Segundo ele, Archer tentou vender um apartamento no Rio de Janeiro para comprar a redução de pena.

    "Ele conhecia os esquemas. Queria levantar US$ 1 milhão com a venda do apartamento em Ipanema", conta Prado. "O Brasil não é tão diferente na corrupção. Mas Bali vai além."

    João Wainer/Folhapress
    Dianapur street,Bali,Indonesia rua gay de Bali. Materia especial sobre o submundo de Bali, na Indonesia, local que os brasileiros condenados a morte viviam e frequentavam. Foto: Joao Wainer/Folhapress ****EXCLUSIVO FOLHA,NAO UTILIZAR SEM AUTORIZACAO**** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Fachadas de casas noturnas na Dianapur Street, rua gay da ilha de Bali, na Indonésia

    AMBULANTES DA NOITE

    Comprar drogas é uma artimanha na qual só quem mora ou frequenta Bali há muito tempo se arrisca. Jovens com quem conversamos nas ruas disseram ter medo. Toda sorte de drogas, porém, está disponível nos clubes, via fornecedores ou pelas mãos de ambulantes da noite.

    Mais uma madrugada em Bali. Sexta-feira, dia 27 de fevereiro. O cenário é Kuta, que ficou conhecida em 2002 quando um ataque terrorista a um bar matou 202 pessoas. Numa calçada a poucos metros do monumento em homenagem às vítimas, somos abordados.

    "Marijuana?", o balinês pergunta. E nos mostra o pacote com a erva. Preço: 400 mil rupias, cerca de R$ 125. "Ecstasy?", outro balinês coloca bem à frente dos nossos olhos um tubinho com pílulas coloridas. Preço: 500 mil rupias, em torno de R$ 157. A oferta é maior até mesmo do que a procura.

    "Costumam oferecer alguma outra coisa primeiro, como transporte ou massagem. Quando você diz não, fazem a segunda oferta", comenta o australiano Chris Manschrell, 31, habitué no verão balinês.

    "Parte da droga vendida nas ruas é falsa. Também existe o risco de te venderem e avisarem a polícia. Bali é um jogo de sorte ou azar."

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