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    Iniciativa mundial, encontros para falar de morte ganham espaço em SP

    CAMILA APPEL
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    25/04/2015 02h00

    É sábado à tarde. Mulheres e homens de 30 a 75 anos aos poucos se aconchegam na pousada Ziláh, nos Jardins (zona oeste de São Paulo), para falar sobre um assunto incomum e, à primeira vista, obscuro: a morte.

    É a quarta reunião do Death Cafe Sampa, primeiro representante no Brasil da organização mundial de "cafés da morte".

    O modelo foi elaborado a partir dos conceitos de Bernard Crettaz, um sociólogo e antropólogo suíço, pioneiro na ideia de formar espaços para falar sobre a morte.

    Desde setembro de 2011, já foram oferecidos 1.774 encontros pelo mundo. Qualquer pessoa pode abrir um em sua cidade, ou seja, organizar um grupo de discussão sem agenda específica, utilizando o nome, a metodologia e os meios de divulgação da franquia.

    Karime Xavier/Folhapress
    Elca Rubinstein, que participa do Death Cafe em São Paulo
    Elca Rubinstein conheceu os 'cafés da morte' nos Estados Unidos e trouxe a iniciativa para o Brasil

    "Como pré-requisitos, colocam a necessidade de ser uma atividade não lucrativa, não 'vender ideias', não ser filiado a instituições e não se apresentar como um espaço de terapia", afirma Elca Rubinstein, economista que trabalhou 18 anos no Banco Mundial, em Washington, onde conheceu a iniciativa e resolveu trazê-la ao Brasil, em dezembro de 2014.

    Uma recomendação é servir bolo ou algo doce para contribuir para um clima informal, indicado ao se falar de tópicos pesados.

    No momento, a organização se prepara para abrir uma unidade física em Londres.

    Por enquanto, os grupos se encontram em cafés ou outros espaços como pousadas, que cedem o local, preparam chá, café, quitutes e cobram apenas os alimentos.

    "Venho ao Death Cafe porque entendi que vou morrer e estou curtindo a ideia de que essa consciência me possibilita planejar o futuro e, assim, viver melhor", diz Elca.

    MEDO

    O Death Cafe Sampa se reúne uma vez por mês. Em março, o grupo de 27 pessoas foi dividido em dois, o dos iniciantes e o dos veteranos.

    No dos iniciantes, mais do que o medo da morte, o tema predominante foi o desejo de não ficar incapacitado antes dela. "Me assusta o sofrimento, não a morte", disse um dos participantes, que pediu para não ser identificado.

    "Nós humanos somos incapazes de aprender a perder", afirmou um homem por volta dos 70 anos.

    "Acho difícil ter que tomar a decisão pela minha mãe, de suspender ou manter tratamentos, caso ela fique incapacitada de tomar essa decisão", disse uma mulher de 54 anos.

    O principal motivo ouvido pela Folha para participar de um Death Cafe foi poder falar de forma leve sobre um tema tabu. "Desmitificar a morte" e "ter um espaço para uma conversa que não se pode ter em casa" foram algumas das justificativas citadas.

    ACEITAÇÃO

    Uma participante disse que não conta para a família ou amigos que está indo para um Death Cafe, porque eles achariam perda de tempo. "As pessoas associam morte com mau agouro. Mas lidar com a realidade não é negativo, é necessário e produtivo."

    Os participantes apontaram, como resultado do encontro, uma maior liberdade em relação à vida, aceitação da morte, do envelhecimento e de doenças. "Morte é algo natural, quem coloca o peso somos nós", disse um homem de 40 anos.

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