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    Vítimas contestam livro de mulher que diz ter achado ex-médico Abdelmassih

    EMILIO SANT'ANNA
    DE SÃO PAULO

    31/05/2015 02h00

    "Por acaso nós não temos cara, somos anônimas?"

    "O livro é sobre a minha vida, não tinha que citá-las."

    "É autopromoção."

    "É um problema de ego. Não da minha parte."

    "Ela transformou a realidade numa ficção, talvez para virar um bom filme."

    "Eu cacei aquele monstro."

    "Claro que não."

    Elas se apoiavam e dividiam as angústias de terem sido violentadas. Há pouco menos de um ano, porém, a relação começou a azedar, até que há 15 dias... Azedou de vez.

    Helena Leardini, 45, dona de casa; Teresa Cordiolli, 64, gerente condominial; Ivani Serebrenic, 47, empresária; e Nelma Luz, 50, farmacêutica, continuam unidas. A amizade com a estilista Vanuzia Leite Lopes, 55, no entanto, parece difícil de ser retomada.

    Essas mulheres são algumas das vítimas do ex-médico Roger Abdelmassih, 71.

    Condenado a 181 anos de prisão por 37 estupros, o homem que já foi considerado o "papa da fertilização in vitro" vivia como fugitivo quando foi capturado no Paraguai em 19 de agosto de 2014.

    Era o dia pelo qual elas mais esperavam, mas os problemas recomeçaram. Desde 2012, elas tinham um projeto de escreverem um livro juntas –ideia de Teresa, diz Helena. Elas guardam uma troca de mensagens com os detalhes.

    O projeto não foi em frente e, no dia 14, as amigas foram surpreendidas ao lerem nos jornais que Vanuzia –a Vana– havia escrito seu próprio livro: "Bem-Vindo ao Inferno". A frase é a mesma que ela lançou quando o ex-médico desembarcou em São Paulo escoltado por policiais.

    O problema, porém, diz Helena, está no subtítulo: "A História de Vana Lopes, a Vítima que Caçou o Médico Estuprador Roger Abdelmassih". E, claro, no conteúdo.

    "Então somos coadjuvantes?", pergunta Helena, que afirma que ela e as amigas ficaram sempre juntas e participaram do processo. "Ela tomou para si uma história que também é nossa", diz Nelma.

    Com prefácio do juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, e da advogada Rosangela Wolff Moro, sua mulher, "Bem-Vindo ao Inferno" ganhou espaço nos jornais.

    Em meio ao escândalo de corrupção na Petrobras, Moro foi com a mulher ao lançamento do livro, na avenida Paulista. Saiu aplaudido.

    No prefácio, o casal ressalta que a autora fez "justiça com o próprio mouse". É uma referência à luta de Vanuzia nas redes sociais, por onde ela diz ter feito contato com "milhares" de pessoas que lhe deram pistas e documentos que indicaram o paradeiro do homem que a havia estuprado em 1993.

    "Não escrevo nada que não possa provar", disse Vana, mostrando documentos que recebeu de testemunhas –extratos bancários e contas telefônicas da atual mulher de Roger, Larissa Abdelmasih.

    Um dia após Vana receber a Folha, outras quatro vítimas de Roger que fazem parte de um grupo de conversas on-line mantido pela estilista procuraram a reportagem para confirmar o protagonismo da autora na caçada ao médico.

    "Isso tudo é uma calúnia. Elas querem levar o mérito que é da Vana, e só dela", diz Gislaine Afanasiev, 44.

    "A Vana é uma das piores vítimas desse monstro, mas esse livro é uma ficção", diz Ivani. Em breve, o desentendimento vai ganhar novo capítulo. "Vamos fazer uma interpelação judicial para que ela explique o que está no livro", diz Marçal Alves de Melo, advogado das amigas.

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